Regras de boa convivência no WhatsApp
Filipe Oliveira, Folha de S. Paulo
Uma habilidade que passou a ser exigida do
jornalista com o avanço tecnológico é o gerenciamento eficiente de WhatsApp. A
cada dia, o contato com fontes e colegas por e-mail e ligação telefônica perde
um pouco de espaço e o volume de mensagens, importantes ou não, cresce
exponencialmente.
Muitas pessoas, quando ficam sabendo que tenho
deficiência visual, passam a enviar mensagens de áudio. Pode até ser bom quando
a intenção é bater papo com calma, mas não precisa e não é uma boa ideia se o
assunto for urgente, pois provavelmente eu vou deixar as gravações para o final
da fila. Isso porque os celulares tem um sistema leitor de tela que passa para
mim em alta velocidade tudo o que está escrito, inclusive figurinhas. Se estou
com ele ligado e na mão, a notificação aparece e é lida na hora.
Minha solução para dar conta de todos os recados
antes da hora do fechamento é usar um pequeno teclado sem fio que se conecta ao
celular para conseguir responder a todos rapidamente. Os dias em que por algum
acaso esqueci de levá-lo para o trabalho trouxeram sensação parecida com a
daqueles sonhos nos quais saio de casa e só percebo que estou de pijamas quando
chego no trabalho.
Mas trabalhar com o aplicativo dessa forma tem suas
diferenças. Por isso a pergunta que minha chefe me fez noutro dia é muito boa.
Ela queria saber se, para mim, seria melhor receber mensagens longas ou curtas.
Eu ainda não tinha uma resposta pronta para isso. É
certo que me causa terror quando alguém começa a enviar uma sequência com meia
dúzia de mensagens curtas de uma só vez. O apito do celular já me coloca a
imaginar qual foi o desastre que aconteceu ou o que será que eu fiz de errado
dessa vez para alguém me procurar com tanta urgência. Na maioria das vezes, não
é nada. A primeira diz “Oi, Filipe”, a segunda diz, “Boa tarde”, a terceira “te
enviei um email agora” e a quarta “Você confirma que chegou?”.
Isso me faz pensar que textos longos são melhores.
Acontece que, caso o redator exagere, também há desvantagens. Isso porque, ao
menos no WhatsApp, só consigo acessar a mensagem do começo ao fim. Se chega
alguma outra notificação qualquer enquanto o sistema que lê para mim está no
último de sete parágrafos, já era, será preciso começar tudo outra vez.
Acontece todos os dias. Eu estou ali, querendo
saber o final da história, até que o aparelho começa a apitar: “Oi, Filipe”,
“Tudo bem?”. Começo de novo. Acelero a voz artificial para que chegou no final
mais rápido. Voltei ao mesmo ponto e…”Está um dia bonito né?”. Suspiro.”
Há uma gambiarra para lidar com a situação. O que
faço é copiar o texto todo de uma vez e colar num bloco de notas, assim posso
ler aos poucos, descendo linha por linha com ajuda do teclado. Preciso fazer
isso com tanta frequência que estou com mais de 300 notas que foram criadas
dessa forma e não apaguei.
Para tentar evitar os dois problemas, minha
proposta para uma etiqueta cibernética para não enlouquecer seu amigo que tem
deficiência visual é usar o caminho do meio. Mensagens próximas a um tuíte de
140 caracteres estão de bom tamanho. Mais do que isso, melhor dar uma picotada.
Mas deixa o “oi, tudo bem” junto com a primeira mensagem e o “obrigado, tchau”,
junto com a última, por favor. Minha pressão arterial agradece.
Se o aplicativo já é fonte de adrenalina quando a
conversa é com uma pessoa por vez, tentar acompanhar uma série de grupos
simultâneos é uma montanha-russa cheia de loopings que anda de frente para
trás.
Ali, além de ler o conteúdo de cada pequena
mensagem, meu fiel leitor de telas fala o nome de quem mandou cada uma delas.
Então, a cada “oi”, “tudo bem”, “hahaha”, ou “kkkk” de um participante do
grupo, escuto antes a frase “mensagem de fulano”. Quando a conversa está
frenética, com todos falando ao mesmo tempo, é inevitável que eu tenha de
correr saltando barreiras para não ficar atrasado no assunto, com tanta
“mensagem de amigo X”, rsrsrs” para ultrapassar..
Claro que o WhatsApp faz bem ao avisar quem
escreveu o quê. A acessibilidade no aplicativo é boa, não imagino solução
melhor. Minha única sugestão mesmo é acabar com isso tudo e voltarmos às
comunidades do Orkut.
Sinto ainda mais culpa por não conseguir interagir
bem em grupos formados principalmente por pessoas com deficiência visual. Ali,
o que rola solto mesmo são as mensagens de áudio. Quando volto lá após um
tempo, tem mais de hora de conteúdo me esperando. Desisto antes de começar.
Pois é, amigos, não é nada particular, mas já
planejo meu detox virtual para o final do ano. Não aguardem respostas rápidas
para suas mensagens, mas ficarei feliz em receber um telefonema de Natal.
Veja: Primeiras impressões sobre os
resultados das eleições municipais https://bit.ly/2VoPPYY
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