29 setembro 2024

Uma crônica de Cícero Belmar

Jogo de cena
Cícero Belmar*  

Senhoras e senhores, o terceiro sinal já tocou e as cortinas serão abertas: a partir de hoje começa o Tudo ou Nada, parte final desta teatralização sem nenhuma expressão artística, que é a campanha eleitoral municipal. Nos próximos 20 dias será reforçada a disputa pelo voto do eleitor nas ruas, meios de comunicação tradicionais e mídias sociais.

Campanha eleitoral é uma grande encenação. Às vezes, uma comédia, uma farsa, uma ópera bufa, mas em geral termina sempre em drama. Ou ainda em tragédia administrativa. Na disputa pela preferência do eleitorado, os atores principais se apresentam com máscaras, algumas criadas por marqueteiros. Outras, pela intuição de assessores.

Afinal, todo mundo espera um diferencial de quem se candidata a um cargo. Assim surgem as máscaras: quem disputa, se apresenta como redentor das causas impossíveis. Se a face verdadeira do candidato, ou da candidata, for revelada, não receberá único voto.

Reta final é luta contra o tempo, estresse a mil, um salve-se quem puder. Numa cidade cheia de rios como o Recife, se um candidato a vereador, por exemplo, se encontrar com o outro sobre a ponte, valei-me Nossa Senhora das Águas Profundas. A segunda quinzena de setembro, tradicionalmente, é quando a disputa ganha esse ritmo acirrado do vale-tudo.

Recife é só um exemplo. Das nervosas capitais aos mais pacatos rincões, os candidatos reforçarão a atuação até seis de outubro, dia do primeiro turno, porque político sem tribuna, morre. E o que isso tem a ver com teatro? É que as máscaras têm caráter dramatúrgico. Nessa jornada, há um roteiro pronto e os atores, bem ensaiados, não fugirão aos papéis que lhes couber interpretar.

Discurso de político é resenha preparada para lhes convencer, senhoras e senhores espectadores. Tudo o que você tem a fazer é ouvir e assistir. Não sei dizer quais os atores estarão interessados em lhes dizer a verdade e somente a verdade. É possível, até, que a verdade seja a única derrotada nesse jogo de cena. O que vai interessar aqui e agora é a persuasão.

Os discursos dos políticos são baseados em estudos e pesquisas. Os marqueteiros descobrem quais são os ressentimentos e as desilusões da população e constroem seus personagens para vocalizar esses sentimentos. Assim, fisgam os eleitores mais sensíveis a certos apelos. Dito isso, não é a hora de discutirmos vãs ideologias e filosofias.

Claro que todos os candidatos e candidatas se dizem capazes de construir um futuro cheio de graça. Oferecem felicidade e realizações plenas aos eleitores, e o prometem na alegria e na tristeza; na saúde e na doença. Fazem igual aos noivos, na hora do casamento, mas só Deus é quem sabe em que esse amor sincero vai resultar nos dias seguintes.

Nós, eleitores, temos a grande responsabilidade de escolher aquele ou aquela que nos representa. Já que somos obrigados a votar, votemos em quem atender aos nossos interesses e às nossas aspirações. Naqueles ou naquelas que conhecemos. Ruim mesmo seria não podermos votar. Ou, ainda, se fôssemos coagidos e obrigados a votar em alguém. O que representaria um estupro às nossas consciências. O que não é o caso, para nós que estamos avançamos. Viva, pois, a democracia!

*Jornalista, escritor

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