27 outubro 2012

Triunfo
Carol Bradley, no blog Um conto por dia umcontopordia.com.br
 

Sentados no batente da escada, sentiam o cheiro do restaurante no outro lado da rua. Era um rodízio de carne, de carro, de gente. Homem, mulher, gordo, magro, carecas, jovens. Ali cabia todo mundo, menos eles, os vizinhos.


Homens engravatados, mulheres de salto alto. Meninos de chinelo, não havia. Depois da pelada na Casa do Estudante, eles alimentavam-se de imaginação. Seriam um daqueles que descia do carro com motorista. José veio com 14 anos de Salgueiro.

Trouxe na mala roupas, sapatos e ideal. Seria juiz e iria lutar contra as injustiças, como a que presenciara na cidade natal. Enquanto o prefeito bebia água mineral em filtro de ouro, a maioria da população espremia pedra para tirar gota d`água.

No Recife, começou a estudar com outros rapazes que seriam médicos e engenheiros. Como a sopa da Casa era rala, dormiam cedo, para a fome não chegar antes do sono.

Era companheiro dos livros. Passou em décimo lugar no curso de Direito da Federal. Onde havia estudado Joaquim Nabuco, agora estudava José Alves.  No terceiro período passou em um concurso para ser estagiário da Celpe. Seus colegas eram filhos de advogados e desembargadores, ele de Maria Aparecida.

No fim do ano, a empresa promoveu a confraternização do departamento jurídico. Por capricho do destino, entrou no restaurante que só conhecia de cheiro. Vestindo terno e gravata esperou sentar os diretores, advogados, estagiários e ficou na última cadeira.

O restaurante estava lotado. Espetos cobertos de carne desfilavam pelas mesas. O garçom se aproximou. Era Pedro, o goleiro do time. Em um tom de voz nada discreto, dirigiu-se ao companheiro de bola. Sr. Alves, é uma honra tê-lo novamente conosco. A mesa do senhor vai ter uma atenção especial. Percebeu o olhar admirado dos colegas e do chefe. Ninguém sabia que o magrelo era tão importante. O que o senhor deseja para beber? Uma cachaça, por favor.

Obs. Inspirado no meu amigo, João Arnaldo.

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