05 novembro 2025

Uma crônica de Abraham Sicsu

Naasson e a Caixa do Tempo
Abraham B Sicsu  

7 de novembro, data que me é muito significativa. Meu pai faria 114 anos. Lembro sempre, todo ano, muito aprendi, muito vivi, muito afeto tive, ele me ensinou. Este ano, 2025, algo especial vai acontecer.

Também na família, à qual me agreguei, faz quase cinquenta anos. Uma efeméride inusitada, esperada por muitos anos, um século se passou. Envolve o avô de minha mulher, Naasson Figueredo.

Naasson nasceu em Pombos, na Mata pernambucana. Região das casas de farinhas, das plantações de macaxeira. Não terminou o primário, mas, autodidata, leu de tudo da literatura universal. Sua paixão, a História, fez com que estudasse os fortes de Pernambuco e Paraíba. Escreveu e se tornou sócio do Instituto Arqueológico de Pernambuco.

Trabalhou no campo, mas foi para a cidade. Empregou-se na extinta Livraria Francesa de onde passou para o Diário de Pernambuco. Lá foi noticiarista, como se chamavam os que escreviam e buscavam notícias, tipo de reportes que participa da redação. E, esteve presente no centenário do Jornal, centenário que à época foi comemorado, onde começa nosso relato.

Vocês sabem o que é uma “Caixa do Tempo”? Muito comum em comemorações de datas significativas, pelo menos há pouco tempo atrás.

Preservar a memória, prever passos futuros. A Caixa é um recipiente, com formas e materiais variados, em que se depositam documentos e objetos para serem abertos no futuro, para contar a história vivida e os sinais que ela aponta para um tempo vindouro.

Exatamente, algo que não pode ser revelado num determinado momento, mas que se deseja ser conhecido num futuro, em geral, distante.

Naasson fez uma participando das comemorações. Mais precisamente uma Lata do Tempo. Quando o Diário completava cem anos. Teria que ser aberta, nos duzentos anos.

Depositou no Instituto Arqueológico, pelo orgulho que tinha da Instituição a que pertencia. Na frente, um aviso em letras garrafais, no português como escrito à época:

Esta lata contem a notícia exacta de tudo quanto fez o DIARIO DE PERNAMBUCO para solenizar o seu primeiro centenário , em 7 de novembro de 1925.  Oferecida pelo sócio deste “INSTITUTO” Naasson Figueredo com a condição de somente ser aberta em 7 de novembro  de 2025

Mistério, por que esperar cem anos? Que segredo estaria protegido? As pessoas daquela época não conheceriam nunca? Aguça a curiosidade, faz com que se aguarde com interesse o momento.

Pois é, assim foi feito. A data está chegando e começam os preparativos.

A família e o instituto se mobilizam. A única filha viva mora distante e com dificuldades de locomoção, 96 anos, não poderá se fazer presente. Mas, seus quatro filhos já confirmaram a presença. Passagens na mão virão de longe.

A esposa de outro neto também confirma seu deslocamento para o Recife. Bisnetos e até tataraneta estarão presentes. Todos querendo saber o que será revelado, uma data que junta a descendência entorno de um evento por demais esperado.

O Instituto honra a tradição e prepara a comemoração conforme o desejo de seu antigo membro. Prepara-se para o acontecimento.  Às 15 horas será aberta. Um frugal, mas muito significativo brinde. Um pequeno cálice de vinho do Porto e um pedaço de pão de ló. Não qualquer um. Da tradicional Padaria de Santa Cruz, orgulho do centro festivo da nossa cidade. Tudo organizado.

Ansiosos, esperamos o momento. Um homem que veio do campo, se firmou pelos autoestudos e pelo desejo de absorver conhecimento, consegue fazer com que parentes e agregados se unam para entender melhor o que é compartilhamento e sentimento de união. Será essa a mensagem?

Consegue, através da curiosidade saudável, lembremos que esta é a base do método dedutivo, base da nossa ciência que ele tanto respeitou, fazer que cem anos após gente se desloque e, com felicidade, diga ser pertencente a este grupo que teve um visionário.

De quê? Saberemos na sexta feira.

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Leia: "O cheiro da tangerina", poema de Ferreira Gullar https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/09/palavra-de-poeta_20.html

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