03 novembro 2011

Dimensão estrutural da mobilidade urbana

Mobilidade urbana pede debate consistente
Luciano Siqueira

Publicado no portal Vermelho http://www.vermelho.org.br/

Evidente que todo e qualquer tema deve ser tratado com a abrangência e a profundidade que a seriedade recomenda. Sobretudo quando se trata de algo de interesse público – como o impasse da mobilidade urbana que aflige a quase totalidade das cidades grandes e médias do País.

Por isso fere os ouvidos escutar abordagens ligeiras, superficiais e pirotécnicas que vão proliferando em vários ambientes e propagadas nos meios de comunicação, frequentemente influenciadas por projetos eleitorais futuros. Disse isso de maneira cuidadosa, para não ferir suscetibilidades, ao iniciar minha breve intervenção sobre o assunto em reunião na Assembleia Legislativa, segunda-feira última, à qual compareceu o ex-prefeito do Recife, deputado João Paulo – que nos trouxe significativa contribuição ao debate.

A mobilidade já era essencial e prioritária em todas as cidades e metrópoles ao longo da História, adverte o professor Geraldo Santana, da Universidade Federal de Pernambuco, competente estudioso dos problemas urbanos. E no Brasil – tenho mencionado isso com frequência – há que se reconhecer, no trato da questão, a dimensão histórica, estrutural; e a dimensão imediata, conjuntural.

A industrialização do País, que ganhou grande impulso a partir dos anos 30, e a inexistência de uma reforma agrária distributiva produziram o chamado êxodo para os centros urbanos, que em apenas cinco décadas inverteu a relação entre a população urbana e a rural, na ordem de 80%. Isto sem que as cidades estivessem preparadas para tanto.

Mais: como bem assinala o professor Geraldo Santana, não apenas a partir do governo JK, quando aqui se instalou a indústria automotiva, mas nos períodos que se seguiram até os dias recentes, sob o governo Lula, prevaleceu a ênfase no transporte rodoviário, seja de carga, seja de passageiros, em prejuízo das alternativas marítima, fluvial, e ferroviária. Nas cidades, prioridade total ao veículo individual.

Mais recentemente, quando eclodiu a crise global em 2008, para evitar o colapso da indústria automobilística e o consequente desemporego, Lula flexibilizou a política fiscal, reduzindo o IPI, e facilitou o crédito de modo a estimular o consumo de automóveis. Com isso, conseguiu manter o nível do emprego no setor, mas acrescentou uma carga exponencial de pressão sobre os espaços urbanos, agravando enormemente a crise de mobilidade. Basta ver o Recife, cujas vias são tomadas por automóveis e motos, alongando exageradamente o tempo de deslocamento mesmo a distâncias fisicamente pequenas.

Ainda no primeiro governo Lula, na gestão de Olívio Dutra no Ministério das Cidades, foram lançados os fundamentos de uma nova politica nacional de mobilidade urbana, que entretanto encontra enormes dificuldades de prosperar devido ao baixo poder de investimento público que ainda persiste no Brasil. Livramo-nos da dívida externa (resta um resíduo do Clube de Paris), mas ainda padecemos de uma dívida pública interna monstruosa e retroalimentada pela política de juros altos. Superar esses obstáculos é imprescindível à inversão de prioridades entre o carro individual e o transporte público de massas, que implica em pesados investimentos. Uma luta que cabe a todos nós travar.

Um comentário:

Geraldo Santana disse...

TERRITÓRIO DA MOBILIDADE - Com o censo de 2010, o país passa de urbano para metropolitano, pois mais da metade de sua população hoje se concentra em 30 metrópoles, ou aglomerados metropolitanos já institucionalizados. Será para essa escala - da cidade-metrópole -e não para cada município, que a mobilidade deve ser estudada e equacionada.