Vencedores sem brilho
Luciano Siqueira
Publicado no Blog Algomais
Comentar futebol não é fácil, pois é praticamente impossível formular uma opinião isenta de emoção. Já fui desses para quem o melhor time do mundo era o seu, ainda que as evidências revelassem o contrário. Chegava até a experimentar uma boa dose de revolta porque fulano ou sicrano – poxa, um talento a ser reconhecido! – não era lembrado para a seleção brasileira.
Aos poucos fui me dando conta de que, nessa matéria, a fronteira entre a razão e o ridículo é nanométrica. Bastava escutar as polêmicas gigantescas travadas entre alvirrubros, rubro-negros e tricolores na calçada do Bar Savoy.
O tempo passou, a militância fez-se razão de vida, tornei-me pai... e foi-se pelo ralo o interesse cotidiano pelo futebol. Sequer me dispus a trocar uma tarde de domingo com a família por um bom clássico pernambucano. A seleção brasileira quase que só acompanho na Copa do Mundo e não dou a mínima para esses amistosos caça níqueis que equipes montadas ao sabor das circunstâncias – e dos interesses dos grandes patrocinadores – fazem de contas que são a canarinha e enfrentam Gabão, Nova Zelândia, Emirados Árabes, Costa Rica e que tais.
Isso tudo é para dizer que, mesmo sem a autoridade de quem frequenta os estádios – ou as arenas, como si diz hoje – anoto que a temporada se encerra com uma tripla vitória pernambucana: o Santa Cruz pulou da quarta divisão para a terceira; Náutico e Sport voltaram à primeira. Sem brilho.
Vitória é vitória, e pronto. Quem quiser que ponha gosto ruim. Na política, então, atribui-se a Agamenon a assertiva de que feio é perder – ou seja, vale vencer de qualquer jeito.
É que o Santa Cruz, a despeito do apoio de sua vibrante e generosa torcida, enfrentou muito dificuldade para ultrapassar concorrentes que, sem nenhum preconceito, não têm nenhuma tradição em competições nacionais, como os modestos Alecrim e o homônimo tricolor, ambos de minha terra, Natal. E outros tantos que sequer guardamos o nome. Mais de 60 mil torcedores no Arruda e um parto para que o gol salvador fizesse a galera explodir. Às vezes nem isso.
O Náutico passou ao grupo de elite por sua relativa regularidade, em comparação com concorrentes que percorreram trajetória em gangorra. Tanto que fez festa após perder para o inexpressivo Boa Esporte, beneficiado pelo fracasso de concorrentes. E o Sport foi salvo quando já respirava por aparelhos. Fez uma série de surpreendentes vitórias consecutivas, é verdade; mas teve o empurrão de outros, como o Vitória, da Bahia, que se deixou derrotar dentro de casa com dois gols nos dois últimos minutos de uma partida considerada ganha.
E os rubro-negros, todo mundo viu, refletiu sua caminhada claudicante e inexpressiva na substituição de técnicos, na formação de um elenco tão caro quanto incompetente. Chegou aonde chegou quase por milagre.
Sou do tempo em que os clubes locais armavam times de primeira a partir da prata da casa e da região. Gente que ia em toda bola dividida, vestia a camisa de verdade e interagia com a torcida como se todos estivessem, efetivamente, na luta. Seria possível voltar ao esquema de antes, ou temos mesmo é que formar equipes com a mescla de ex-craques em fim de carreira (com todo respeito) e desconhecidos do interior de São Paulo aqui apresentados como supostos futuros Ronaldinhos?
Dois velhos heróis alvirrubros, da fase gloriosa do hexa, me confidenciaram certa vez que perderam a tesão e quase não vão aos estádios – porque, segundo eles, “o torcedor é o último a saber”.
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