Luciano
Siqueira*
Revendo notas sobre o projeto Parque
do Capibaribe - Caminho das Capivaras,
uma das iniciativas marcantes da atual gestão na Prefeitura do Recife em termos
de retomada do planejamento urbano, resolvi reproduzir aqui essa pequena
crônica, que escrevi há uns cinco anos.
.
Tu vens de muito longe, há muito tempo, desde que te chamavam de
Caapiuar-y-be. Vences barreiras, abres veredas – e chegas aqui qual amante que
se aloja no leito da mulher amada: ora forte, exuberante; ora sinuoso, como que
a contorcer-se preguiçoso e carente após tremenda peleja.
A cidade
amada o acolhe sequiosa do teu vigor e do teu afeto. O tempo, porém, sob o
vendaval da moderna desordem, perturba a tua relação com a cidade como os
desencontros da vida ameaçam uma relação de amor. Já não és mais aquele, que ao
olhar do poeta Cabral “Engoliu as terras, engoliu as casas,/Engoliu as cercas/E
engordou seu corpo/Engolindo as noites, engolindo os dias.”
Fostes
envolvido pela sanha do lucro, do fausto, da ambição, da desesperança, da dor,
do desamor.
Agora, quando
tu encontras o teu irmão gêmeo, o Bebyrype, e se abraçam ao encontro do imenso
oceano, pareces enfim derrotado. Mas ainda conservas a energia que brota do teu
nascedouro, fonte renovável de tua força; e a cidade, essa amante cruel, como
que arrependida, parece enfim acordar da longa noite de insensatez e, envolta
pelo clamor da reinvenção da vida, busca reiventar-se a si mesma e te
reencontrar como dois seres que se amam retornam à pureza do primeiro encontro.
* Publicado
no jornal Perto de Casa e no portal Vermelho.
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