30 agosto 2016

Momento crucial

A dignidade contra a desfaçatez
Luciano Siqueira, no Blog da Folha

Durou mais de 13 horas o pronunciamento da presidenta Dilma, seguido de interrogatório, ontem no Senado.
Nos dias precedentes, senadores integrantes da maioria pró-impeachment alardearam que colocariam a presidenta contra a parede, arguindo-a de modo a levá-la a reconhecer, enfim, que praticara crime de responsabilidade através das denominadas pedaladas fiscais.
Porém o que se viu foi a conduta digna e altiva da presidenta contra a posição agressiva da maioria empenhada em derrotá-la.
Dilma não foi derrotada.
Afirmou suas convicções, reconheceu erros e acertos na condução do governo, sem contudo abaixar a cabeça um só instante — mesmo quando provocada.
Derrotada poderá ser, e provavelmente será, na votação final no Senado a democracia.
Anêmicos em argumentos consistentes sobre acusação de crime de responsabilidade, a maioria dos senadores oponentes se ateve a considerações sobre a crise econômica que o Brasil atravessa, atribuindo à presidenta a responsabilidade única e total.
Houve até quem assinalasse que a crise mundial não influencia (sic) a crise brasileira!
Nada mais rasteiro e inconsequente.
E se o Senado não reproduziu o mesmo espetáculo deplorável vivenciado pela Câmara dos Deputados, não ficou muito distante em desfaçatez. 
Na verdade, ocorreu e está ocorrendo o exercício do parlamentarismo em plena vigência do sistema presidencialista.
Não podendo provar crime de responsabilidade, pré-requisito constitucional, se exercita o "voto de desconfiança", expediente próprio do parlamentarismo quando uma maioria contrária ao governo vigente resolve afastar o primeiro-ministro. 
Demais, uns tantos inquisidores pretenderam conferir legitimidade ao impeachment com o argumento de que tendo a presidenta da República comparecido à sessão para defender-se estaria validando judicialmente todo processo.
Ora, quando e em que lugar do mundo um acusado indevidamente ao comparecer a um tribunal de exceção está reconhecendo a legitimidade de tal tribunal!?
O Congresso Nacional — Câmara e Senado —, na prática, se converteram em algo semelhante aos tribunais típicos dos regimes ditatoriais.
É dado que a evolução da sociedade humana não se dá em linha reta, conquistas civilizatórias são sujeitas a idas e vindas, avanços e retrocessos.
Complexa, sinuosa e não raro traumatizante tem sido a evolução da República brasileira.
Vivemos agora um dos seus piores momentos, decorrente do golpe institucional em vias de se consumar.
O que vivemos ontem, na sua expressão mais concentrada, será reconhecido adiante como marco em nossa história institucional. E a presidenta Dilma, pela sua correção e bravura, mais do vítima terá seu lugar na História pelo seu exemplo de seriedade, resistência e coragem cívica.
Quanto aos seus algozes, dificilmente disso não passarão. 

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