Luciano Siqueira
Em debate recente, da plateia me veio um comentário de sentido negativo acerca da chamada “nova classe média” – esse contingente de quase trinta milhões de brasileiros que recentemente ascendeu na pirâmide social e passou a contar no mercado consumidor. “É uma parcela da população que se coloca contra as mudanças que desde Lula vêm acontecendo!”, sentenciou a interpelante em tom inquisitivo.
Discordei de pronto. Até porque os resultados eleitorais indicam o contrário, a ponto de analistas terem criado a figura da “teoria do lago invertida”, referindo-se ao fato de que o segmento de maior poder aquisitivo e de mais elevado nível de instrução – a “classe média tradicional” – ter se manifestado muito sensível e acuada diante do bombardeio da mídia e da oposição ao presidente Lula, em seu primeiro governo, enquanto os chamados segmentos C, D e E (na classificação mercadológica) se converteram na base eleitoral principal do presidente, em sua reeleição. Invertendo-se, assim, o que se supunha acontecer antes: o segmento B é que exercia influencia sobre de mais, logo abaixo, que nem as ondas sucessivas a partir da queda de uma pedra sob lago de águas em repouso.
Tanto na reeleição de Lula e como na vitória de Dilma, o movimento deu-se em sentido contrário, a turma menos aquinhoada pressionando os melhores situados social e culturalmente.
Pois bem. Em artigo de alguns meses atrás, na Folha de S. Paulo, o economista Marcelo Neri - com a ressalva de não estar “falando de classes sociais (operariado, burguesia, capitalistas etc.), mas de estratos econômicos” – assinala a importância de se investigar, para a compreensão do que se passa com esse segmento da população, “as relações concretas entre fluxos de renda e estoques de ativos abertos em duas grandes frentes: a do produtor e a do consumidor analisadas em detalhes sociais e setoriais.”
O lado do produtor implica em emprego e empreendedorismo. O lado do consumidor envolve consumo e poupança. E assegura que “a nova classe média constrói seu futuro em bases sólidas que sustentem o novo padrão adquirido. Isso é o que chamamos de lado brilhante dos pobres.”
Sendo assim, imagino cá com meus botões, a evolução da consciência política desse segmento não pode ser subestimada. Talvez seja por isso que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso venha expressando, recorrentemente, preocupação com o fato de que o seu partido, o PSDB, sustenta um discurso muito distante da realidade e dos anseios “da classe média”. E que, segundo ele, urge encontrar o ideário que faça dos tucanos corrente política confiável perante essa gente.
Missão impossível, em se tratando de um partido que pensa o País a partir da Avenida Paulista, como dizia Miguel Arraes. Pois como bem adverte Marcelo Neri, “a nova classe média nasce a partir da recuperação de atrasos tupiniquins. Ela é filha da volta do crescimento com a redução da desigualdade.” Logo, digo eu, tende a manter o apoio às transformações que o Brasil experimenta e que beneficia a maioria dos brasileiros.
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