16 junho 2015

Bandeira de sentido estratégico

A defesa e o fortalecimento do SUS na perspectiva da construção do socialismo

Melka Pinto*, no seu blog

É ano da 15ª Conferência Nacional de Saúde e em meio a crise econômica mundial que chega com força no Brasil e que coloca em disputa o papel do estado para superar a crise, os setores de esquerda, os profissionais de saúde compromissados e os cidadãos em geral que tem responsabilidade com o bem-estar social do povo brasileiro devem garantir a unidade política necessária para defender o nosso Sistema Único de Saúde, o SUS. O povo que constrói diariamente as riquezas do nosso país com suor e fervor deve disputá-las e enfrentar com coragem o acirramento da luta de classes que está dado e a ofensiva que os setores conservadores impõem a agenda política dos avanços. 
Ano passado o povo brasileiro elegeu o congresso nacional mais conservador desde 1964, militares, religiosos, ruralistas, e desde a posse dos parlamentares que as sessões e projetos debatidos nelas refletem os interesses desses setores em detrimento dos interesses da pluralidade e diversidade que configura o povo brasileiro, as mulheres, a juventude, os trabalhadores e os negros da periferia. Além de colocar em xeque perspectivas de avanços para o conjunto da sociedade, ameaçam as conquistas acumuladas nos últimos anos correndo o risco de nos condenar a graves retrocessos no que é estratégico e fundamental para desenvolvimento das pessoas e soberania da nação, as políticas sociais.
A regulamentação da terceirização para atividades fim, dentre outros retrocessos pautados no PL 4330, redução da maioridade penal de 18 para 16 anos e o projeto do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha que garante planos de saúde pra todos os trabalhadores e trabalhadoras formais como um direito, a PEC 451/2014, evidenciam a necessidade urgente de uma reforma política democrática e de fora pra dentro, porque lá dentro a pauta da "constitucionalização do financiamento privado de campanhas" que está sendo aprovada não dialoga com a democracia e fortalece o poder econômico em detrimento do poder político na disputa eleitoral, e o resultado é o que vemos hoje, políticos que não representam o povo e que jogam contra os direitos do povo.
Diferente da concepção de Eduardo Cunha, plano de saúde não é direito, o direito dos trabalhadores e trabalhadoras já está garantido com o SUS no princípio da "universalidade", aliás não só os que trabalham, mas qualquer um tem direito aos serviços de saúde públicos de acordo com suas necessidades. Planos de saúde são empresas que querem lucrar, consolidadas na concepção capitalista que compreendem a saúde das pessoas como uma mercadoria. Eduardo Cunha esqueceu de ler o artigo 196 da Constituição Federal, "a saúde é direito de todos e dever do estado", na verdade ele não esqueceu de ler, ele apenas está retribuindo favores dos planos de saúde que financiaram sua campanha pra que ele fosse eleito.
Comungo com a opinião daqueles que afirmam que o SUS ainda é um bebê e ainda tem muito a ser feito por ele, não podemos deixar de analisá-lo fazendo a leitura concreta do que é o SUS até hoje de verdade, ele nasceu e já enfrentou o início de um intenso período de desmonte do estado, o período neoliberal em que a prioridade era a ausência de estado nas políticas sociais, nosso sistema público de saúde nunca foi prioridade, somente a partir de 2002 com um governo orientado na lógica do bem-estar social é que as pessoas puderam ter mais oportunidades para terem qualidade de vida o que implicaria também na sua condição de saúde, entendendo "saúde" não só pela ausência de doença, além disso foram ampliados investimentos significativos para o setor, muito aquém do que precisa, porém, significativos.
Todos nós que somos usuários do SUS (todos nós usamos o SUS quando precisamos de uma vacina, quando frequentamos um estabelecimento que tem autorização da vigilância sanitária pra funcionar e outros) devemos ter consciência do que ele representa para um país de dimensão continental e de tantas desigualdades regionais com o nosso, o SUS é o maior sistema público de saúde do mundo que contempla mais de 100 milhões de pessoas, ele não é perfeito, mas ele existe. Não podemos reproduzir o discurso da grande mídia que a toda hora ataca o que é bom pro povo e contamina as pessoas com noticiários que são reais, mas que não contextualizam com toda complexidade do sistema, o discurso que devemos disseminar é o da defesa, a mídia e o povo tem lados e interesses contrários.
O SUS sofre com um financiamento abaixo do que é demandado, com a precariedade da qualidade e planejamento da sua gestão como um todo e a qualificação muitas vezes limitada desses profissionais que fazem o SUS acontecer. Os problemas existem e são claros, precisamos canalizar os esforços para apontarmos os caminhos das soluções mesmo com a correlação de forças desfavorável no momento. A taxação das grandes fortunas é uma bandeira que une diversos movimentos sociais e personalidades que acreditam que deve haver uma reforma no sistema tributário e que na taxação das grandes fortunas essas cargas tributárias devam ser direcionadas para a saúde, essa é uma bandeira fundamental na conjuntura atual porque enfrenta o debate de quem paga pela crise no nosso país, o povo trabalhador não pode ser sacrificado. Além da destinação dos 25% dos royalties do pré-sal para o setor aprovados junto com os 75% para educação no congresso nacional.
Os problemas de gestão é um problema de recursos humanos e de falta de uma política de gestão, apesar de todas as diretrizes e políticas nacionais, falta eficiência, eficácia e falta comprometimento, faço coro com a União Nacional dos Estudantes quando acertadamente nos seus fóruns sempre faz o link da defesa do SUS com a necessidade de uma reforma universitária que pense novos currículos para os cursos de saúde para que as universidades formem profissionais que pensem o SUS, defendam o SUS, que preparem essas pessoas para pensar um sistema público de saúde humano e avançado, uma reforma universitária que democratize e popularize as pesquisas para que a produção de ciência sirva para o desenvolvimento nacional.
Não poderia deixar de citar também sobre a disputa da concepção de saúde junto às políticas de promoção, prevenção e recuperação de saúde dentro do próprio SUS.  Segundo a Organização Mundial de Saúde, OMS, "saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas de ausência de doenças", portanto para que tenhamos pessoas saudáveis precisamos inverter a lógica de prioridade nos investimentos dos serviços de saúde de forma estratégica para combater o modelo hospitalocêntrico focado na saúde como apenas a ausência de doenças. O povo precisa de atenção primária à saúde, porque saúde se produz com orientações básicas a respeito dos seus hábitos de vida, controle da hipertensão e diabetes e seus agravos, pré-natal de qualidade. A rede básica pode resolver 80% dos problemas de saúde das pessoas e ela não pode ser sucateada, mas ampliada e valorizada.
O SUS também só será forte com muita participação popular na sua construção diária, é pra isso que existem as conferências e conselhos, esses espaços existem para além da contribuição, são espaços de disputa acerca de tudo que elenquei aqui, a sociedade precisa se organizar, o SUS é nosso! E para aqueles que sonham e lutam por um Brasil que tenha o socialismo com nossa cara porque sabem que uma sociedade onde as pessoas sejam o mais importante é possível, fica aqui o recado, mudar a concepção das pessoas sobre a saúde e o SUS é estratégico para a construção do socialismo.

*Presidente da União dos Estudantes de Pernambuco Cândido Pinto (UEP)

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