Luciano Siqueira
Publicado no portal Vermelho
Romper ou não com os condicionantes macroeconômicos herdados da era FHC tem sido, desde o primeiro governo Lula, a um só tempo, necessidade objetiva e dilema político. Uma espécie de tabu: mexer na política de juros altos, no câmbio sobrevalorizado e no rígido sistema de metas inflacionárias e fiscais seria antes de tudo uma irresponsabilidade. Isto na cantilena reverberada pela grande mídia conluiada com o grande capital financeiro.
Em palavras mais simples, o conflito é entre usura versus produção; entre os bancos versus setores produtivos da economia e os interesses do povo e da nação.
Uma questão técnica, sem dúvida; porém essencialmente política, que envolve convicção, vontade e correlação de forças. Diz-se que Lula compreendia o problema, mas hesitava sob a influência da que equipe que formara no Banco Central, liderada por Meireles, e inseguro quanto à correlação de forças. Por isso promoveu redução gradual da taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), usada como referência pela política monetária, entretanto lenta e sujeita a recidivas.
Dilma, que no interior do governo Lula sempre esteve entre os defensores de uma maior rapidez na redução da Selic – na ala dos “desenvolvimentistas”, em contraposição aos “monetaristas”-, dá um passo adiante. Em seu pronunciamento em rede nacional de rádio e TV, no último dia 30, cobrou, de forma enérgica, esforços dos bancos privados para diminuir as taxas de juros cobradas em empréstimos, cartões de crédito e no cheque especial.
“É inadmissível que o Brasil, que tem um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos, continue com um dos juros mais altos do mundo. Esses valores não podem continuar tão altos. O Brasil de hoje não justifica isso. Os bancos não podem continuar cobrando os mesmos juros para empresas e para o consumidor, enquanto a taxa básica Selic cai, a economia se mantém estável e a maioria esmagadora dos brasileiros honra com presteza e honestidade os seus compromissos”, disse a presidenta.
Ela argumenta que com a queda da taxa básica de juros e inflação estável, os bancos privados não têm como justificar a manutenção dos altos juros cobrados dos clientes. Antes já havia promovido uma redução significativa dos juros praticados pelos bancos públicos – Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal -, sobre os quais o governo tem ingerência, como efeito demonstração e fator de concorrência.
Enquanto a presidente dá mostras de determinação nesse sentido, centrais sindicais e entidades representativas da indústria tem se manifestado na mesma direção.
A despeito da reação oferecida pela rede Globo & Cia, para quem a presidenta deseja “satanizar” os banqueiros, ou para certos analistas mais do que suspeitos, para os quais o governo “cutuca o diabo com vara curta”, o que se vê é uma mudança gradativa da correlação de forças, isolando-se os rentistas.
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