Texto critica difusão da ideia de que
austeridade fiscal e monetária seria única solução
Nomes
como Maria da Conceição Tavares, Luiz Gonzaga Belluzzo, João Sicsú
e Marcio Pochmann assinam manifesto, publicado na plataforma Avaaz,
contra o pensamento único que estaria sendo veiculado pela
imprensa tradicional, de que a austeridade fiscal e monetária seria a única
solução para o país. Eles dissertam sobre os perigos de um reforço da
austeridade, e a necessidade de manter as taxas de juros reais em níveis
baixos e de apresentar um regime fiscal comprometido com a retomada do
crescimento. Iniciativas contracionistas, apontam, se necessárias, poderiam ser
adotadas quando a economia voltar a crescer.
Confira
o manifesto na íntegra:
A
campanha eleitoral robusteceu a democracia brasileira através do debate franco
sobre os rumos da Nação. Dois projetos disputaram o segundo turno da eleição
presidencial. Venceu a proposta que uniu partidos e movimentos sociais
favoráveis ao desenvolvimento econômico com redistribuição de renda e inclusão
social. A maioria da população brasileira rejeitou o retrocesso às políticas
que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais.
É
de se esperar que o pluralismo de opiniões fortaleça nossa democracia depois da
pugna eleitoral. Desde 26 de outubro, contudo, a difusão de ideias deu a
impressão de que existe um pensamento único no diagnóstico e nas propostas para
os graves problemas da sociedade e da economia brasileira. Sem o contraponto
propiciado pela campanha e pelo horário eleitoral gratuito, os meios de
comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal
e monetária é a única via para resolver nossos problemas.
Isto
vai na contramão da opinião de economistas de diferentes matizes no Brasil, mas
reverbera o jogral dos porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem
solucionar a desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à
austeridade fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de
impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma
de transferências sociais, serviços e investimentos públicos.
Subscrevemos
que este tipo de austeridade é inócuo para retomar o crescimento e para
combater a inflação em uma economia que sofre a ameaça de recessão prolongada e
não a expectativa de sobreaquecimento. O reforço da austeridade fiscal e monetária
deprimiria o consumo das famílias e os investimentos privados, levando a um
círculo vicioso de desaceleração ou mesmo queda na arrecadação tributária,
menor crescimento econômico e maior carga da dívida pública líquida na renda
nacional.
Entendemos
que é fundamental preservar a estabilidade da moeda. Também somos favoráveis à
máxima eficiência e ao mínimo desperdício no trato de recursos tributários:
este tipo de austeridade, sim, denota espírito público e será sempre desejável.
Rejeitamos, porém, o discurso dos porta-vozes do mercado financeiro que chama
de “inflacionário” o gasto social e o investimento público em qualquer fase do
ciclo econômico.
Tampouco
compreendemos o argumento que associa a inflação ao gasto público representado
por desonerações que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que
reduzem custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no
governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a correção
cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commodities no
mercado internacional.
A
austeridade agravou a recessão, o desemprego, a desigualdade e o problema
fiscal nos países desenvolvidos mesmo tendo sido acompanhada por juros reais
baixíssimos e desvalorização cambial. No Brasil, a apreciação cambial
estimulada por juros reais altos aumenta o risco de recessão, ao acentuar a
avalanche de importações que contribui para nosso baixo crescimento.
É
essencial manter taxas de juros reais em níveis baixos e anunciar publicamente
um regime fiscal comprometido com a retomada do crescimento, adiando
iniciativas contracionistas, se necessárias, para quando a economia voltar a
crescer. A atual proporção da dívida pública líquida na renda nacional não é
preocupante em qualquer comparação internacional.
O
que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de bens públicos e
infraestrutura social reclamada pela população brasileira. Atendê-la não é
apenas um compromisso político em nome da inclusão social, é também uma
fronteira de desenvolvimento, estímulo ao crescimento da economia e em seguida
da própria arrecadação tributária.
Esta
opinião divergente expressa por parte importante dos economistas brasileiros
não pode ser silenciada pela defesa acrítica da austeridade, como se o mantra
que a louva representasse um pensamento único, técnico, neutro e competente. Um
dos vocalizadores desse mantra chegou a afirmar que um segundo governo Dilma
Rousseff só seria levado a caminhar em direção à austeridade sob pressão
substancial do mercado, o que chamou de "pragmatismo sob coação".
Esperamos contribuir para que os meios de comunicação não sejam o veículo da
campanha pela austeridade sob coação e estejam, ao contrário, abertos para o
pluralismo do debate econômico em nossa democracia.
Maria da
Conceição Tavares (UFRJ)
Luiz Gonzaga
Belluzzo (Unicamp e Facamp)
Ricardo
Bielschowsky (UFRJ)
Marcio
Pochmann (Unicamp)
Pedro Paulo
Zahluth Bastos (Unicamp)
Rosa Maria
Marques (PUC-SP)
Alfredo
Saad-Filho (SOAS - Universidade de Londres)
João Sicsú
(UFRJ)
Maria de
Lourdes Mollo (UNB)
Vanessa
Petrelli Corrêa (UFU)
Carlos
Pinkusfeld Bastos (UFRJ)
Alexandre de
Freitas Barbosa (USP)
Lena Lavinas
(UFRJ)
Luiz Fernando
de Paula (UERJ)
Hildete
Pereira Melo (UFF)
Niemeyer
Almeida Filho (UFU)
Frederico
Gonzaga Jayme Jr. (UFMG)
Jorge Mattoso
(Unicamp)
Carlos
Frederico Leão Rocha (UFRJ)
Rubens Sawaya
(PUC-SP)
Fernando
Mattos (UFF)
Pedro Rossi
(Unicamp)
Jennifer
Hermann (UFRJ)
André
Biancarelli (Unicamp)
Bruno De Conti
(Unicamp)
Julia Braga
(UFF)
Ricardo Summa
(UFRJ)
Frederico Katz
(UFPE)
Cristina Fróes
Borja Reis (UFABC)
Luiz Carlos
Delorme Prado (UFRJ)
Fernando Sarti
(Unicamp)
Ramon Garcia
Fernandez (UFABC)
Eduardo
Fagnani (Unicamp)
(Fonte:
Jornal do Brasil)
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