30 setembro 2018

Economia norte-americana


Por que o Fed aumenta as taxas de juros?
A economia dos EUA não parece “tão bem” assim
Por Arthur Macewan*, CartaCapital

A resposta simples: o Fed aumenta as taxas de juros para desacelerar o crescimento da economia. Ou desacelerar ao menos em relação ao que, de outro modo, seria o índice de crescimento. Isto provavelmente vai restringir a expansão do emprego e manter a estagnação dos salários, especialmente aqueles dos trabalhadores não supervisores. A ação do Fed provavelmente também manterá a inflação sob controle.

Em meados de junho, o Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, anunciou que iria aumentar as taxas de juros pela segunda vez em 2018, e indicou que mais dois aumentos estavam a caminho para este ano e haveria outros em 2019.

O Fed elevou sua "taxa de referência" para uma variação de 1,75% a 2%. A taxa de referência é a "taxa de fundos federais", pela qual os bancos emprestam entre si no curto prazo. É a taxa mais diretamente afetada pela Fed, e afeta outras taxas de juros em toda a economia.

O banco pode produzir esse aumento de taxas de juros vendendo títulos do governo que detém atualmente, assim tirando dinheiro (os pagamentos pelos títulos) de circulação.

Com menos dinheiro em circulação, o preço do dinheiro, as taxas de juros, tenderá a aumentar. Os ativos em títulos do Fed são especialmente grandes porque ele comprou enormes quantidades de títulos durante e depois da Grande Recessão, colocando dinheiro na economia e forçando as taxas de juros a quase zero.

O raciocínio?
Ao anunciar a ação de junho, o presidente do Fed, Jerome Powell, declarou: "A decisão que vocês veem hoje é mais um sinal de que a economia dos EUA está em ótima forma. A maioria que quer encontrar emprego está encontrando". Na medida em que este seja realmente o caso, as autoridades do Fed acreditam não ser mais necessário manter baixas taxas de juros como meio de estimular a atividade econômica.

Além disso, elas acreditam que mais estímulos neste momento poderiam induzir à inflação. A ação do Fed tenderá a aumentar as taxas de juros em toda a economia para consumidores e investidores, sobretudo, de novos empréstimos para carros e dívidas de cartão de crédito a hipotecas, de empréstimos para construção a empréstimos para a compra de equipamentos. Esses aumentos de taxas de juros podem não ser imediatos, mas virão. E vão reduzir a atividade econômica em relação ao que teria sido de outro modo.

Crescimento, emprego e salários
Mas a economia dos EUA está realmente em "ótima forma"? Os defensores dessa avaliação citam o que alegam ser um índice forte de crescimento econômico e um índice muito baixo de desemprego como principais evidências de que a economia vai bem.

Quanto ao índice de crescimento econômico, está rápido apenas em relação aos anos desde a Grande Recessão. Mesmo por esse critério, o PIB não vai especialmente bem. A previsão de crescimento do Fed para 2018 é de apenas 2,8%. Embora mais alto que o índice de 2016 e 2017, fica abaixo dos 2,9% de 2015.

O índice de desemprego, 3,8% da força de trabalho em junho, é bem baixo, menor do que o visto desde o final dos anos 1960. O índice de participação da força de trabalho (LFPR) - a porcentagem daqueles com 16 anos ou mais empregadas ou que buscam emprego – tem, no entanto, caído desde o início do século e baixou acentuadamente desde a Grande Recessão.

Em cada um dos quatro anos de 2005 a 2008, o LFPR foi ligeiramente maior que 66%. Em cada um dos cinco anos de 2014 a 2018 (até maio), o LFRP ficou ligeiramente abaixo de 63%, sem tendência aparente. Se o índice de participação fosse tão alto hoje quanto nos anos que antecederam a Grande Recessão, cerca de 7,7 milhões a mais estariam na força de trabalho.
Esses números sugerem que o mercado de trabalho pode não estar tão "apertado" quanto sugere o número de 3,8%. Embora parte do declínio do LFPR seja devido ao envelhecimento da população (a geração "baby boom" deixando a força de trabalho), grande parte do declínio se deve àqueles que desistiram de procurar empregos - os chamados "trabalhadores desanimados".

Se o Fed mantivesse baixas as taxas de juros, continuando a estimular o crescimento, poderia haver empregos disponíveis para esse grupo desanimado.

Mais importante, o estímulo continuado poderia fazer os salários subirem. Embora o chefe do Fed diga que a economia está em "ótima forma", os salários dos trabalhadores não supervisores permanecem estagnados. Entre maio de 2017 e maio de 2018 (o mês mais recente para o qual há dados disponíveis), o aumento médio dos salários de trabalhadores não supervisores no setor privado foi completamente eliminado pela inflação.

Há vários fatores que contribuem para essa estagnação dos salários, incluindo, por exemplo, o pequeno número de trabalhadores sindicalizados, o poder das grandes firmas de definir os salários e a concorrência internacional. Mas o crescimento econômico lento também é um fator. Um crescimento econômico mais rápido e duradouro daria aos trabalhadores - mesmo sem sindicatos - mais poder de negociação porque eles teriam mais opções.

O aumento da taxas de juros adotado pelo Fed tenderá, no entanto, a manter sob controle o aumento dos salários.
* É professor emérito na UMass Boston e sócio da Dollars & Sense.

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