Entre os camarotes e o chão
Luciano Siqueira
Tudo na vida suscita diferentes formas de abordagem. Ou de vivência. Como os festejos populares, de que cada um participa a seu modo, ou não participa.
Luciano Siqueira
Tudo na vida suscita diferentes formas de abordagem. Ou de vivência. Como os festejos populares, de que cada um participa a seu modo, ou não participa.
Diz-se que em Pernambuco o carnaval é a maior festa. Suspeito
que perde em volume de participação popular espontânea para o São João.
Mas cabe controvérsia. E, quem sabe, alguma pesquisa venha um
dia a esclarecer a questão.
Mas ninguém pode desconhecer a força do carnaval — seja pela
vibração das multidões, ao passo do frevo ou do maracatu ou do samba, seja
mesmo pela rica história de luta que encerra.
O direito de brincar livremente nas ruas, no Recife a massa
do povo conquistou com muita luta e sangue, nas primeiras décadas do século
passado. Antes se permitia ao populacho tão somente assistir a desfiles de
agremiações e carros alegóricos das elites.
Aos poucos, enfrentando inclusive severa repressão policial,
os cordões de gente simples, trabalhadores, negros, pardos, tendo à frente
corajosos capoeiristas, abriram espaços no chão para que também fizessem suas
evoluções e vivessem a alegria esfuziante.
Passos do frevo derivam das manobras de capoeiristas, assim
como as conhecidas sombrinhas multicolores originam-se de guarda-sóis e suas
hastes metálicas, usados como autodefesa.
Pois bem. O poder público entra com o apoio material e
organizativo (em certa medida) tanto quanto é possível. Ajuda, apenas. O
principal o povo faz.
Mas na melhor tradição clientelista — essa errônea ideia de
que o Estado existe para satisfazer necessidades individuais —, nós que
governamos a cidade somos abordados de muitas maneiras por gente que quer
alguma facilidade, seja qual for.
Há cinco anos o atual prefeito, de quem sou com muita honra
seu vice, Geraldo Julio, aboliu o camarote da Prefeitura no desfile do
Galo da Madrugada. Sábia decisão, pois
além dos custos contrastantes com a crise de financiamento das cidades, pesava
sobre o governo todo tipo de pressão pelo acesso ao tal camarote. Uma agonia!
Pois
apesar dos cinco anos passados, ainda hoje recebo pedidos advindos de variados segmentos
sociais, inclusive das chamadas autoridades constituídas em cargos proeminentes
em instituições republicanas: muita gente quer porque quer um “convite” para o
dito camarote extinto.
Este ano
vários pedintes inauguraram uma variante: será que o vice-prefeito não
conseguiria acesso a camarotes privados, patrocinados por empresas prestadores
de serviço ao governo municipal? Pouco importa qual tipo de relação
(inadequada) entre o governante e a chamada iniciativa privada.
Lamentável,
pois nada se compara ao carnaval vivido no chão, no meio da massa, na alegria,
no peito e na raça.
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kMGFD
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