A fraude
eleita
Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo
A campanha que resultou na eleição de
Jair Bolsonaro para a Presidência foi beneficiada por fraude
das normas eleitorais. A legitimidade da posse de Bolsonaro e do seu cargo
presidencial é, portanto, no mínimo questionável e pode mesmo ser
insustentável.
Este é o significado objetivo da admissão do WhatsApp de que foi
usado, em “violação aos seus termos de uso”, em “envios maciços” de mensagens
“para atingir um grande número de pessoas”. A afirmação é do gerente de
políticas públicas e eleições globais do WhatsApp, Ben Supple, em palestra no
Festival Gabo (Colômbia). Foi publicada na
pág. A8 da Folha da
última quarta-feira (9).
O representante do WhatsApp não mencionou Bolsonaro. Nem
precisava, para expor o comprometimento dessa campanha com indução
automatizada, como são os softwares de mensagens enviadas a milhares e milhões
—prática vedada pelas normas eleitorais brasileiras.
Já em 18 de outubro de 2018, no mês da eleição, a repórter
Patrícia Campos Mello revelou na Folha que
as agências Quickmobile, CrocServices e Yacows, entre possíveis outras, foram
contratadas por empresários pró-Bolsonaro para disparo de mensagens em massa.
Eram de propaganda do candidato ou, sobretudo, de ataque a adversários.
Àquela revelação seguiu-se uma série de outras, desvendando
parte do que Patrícia Campos Mello chamou de “submundo
dos disparos em massa” na eleição brasileira. Não eram, mesmo,
só crimes eleitorais. Para cometê-los em maior abundância, foram utilizados
falsamente CPFs, sem conhecimento dos seus detentores, e até empresas
fantasmas. Crimes comuns, próprios de estelionatários. Cometidos por alguns
empresários já conhecidos e outros identificáveis sem dificuldade. Com gastos
não declarados ao Imposto de Renda nem à Justiça Eleitoral. Logo, crimes de
caixa dois e de outras adulterações contábeis.
Já às revelações preliminares, por sua gravidade, o Tribunal
Superior Eleitoral abriu procedimento para a praxe de “apurar os fatos”. Mas
punida (com multa) foi, como se poderia esperar, a campanha de
Fernando Haddad, acusada de ativar um site contra Bolsonaro. O
ministro Edson Fachin considerou que tal prática desequilibrou a disputa. A
balança da Justiça tem sensibilidades exclusivas.
A candidatura Bolsonaro não limitou seu benefício, entre as
transgressões suscitadas, a ações eleitoreiras por meios automatizados e em
massa. Essas mensagens estavam repletas de fake news caluniosas, com Haddad
como alvo preferencial. Outra exigência legal descumprida é da inclusão de
empréstimos de aviões, carros, escritórios e apoios materiais em geral no custo
declarado da campanha. Nas contas eleitorais de Bolsonaro, que se gaba do
“gasto de só R$ 2 milhões na campanha”, não foi incluído o alto custo das
contribuições empresariais com a contratação de mensagens em massa. Burla que
se repetiu como fraude na prestação de contas à Justiça Eleitoral.
Nada disso despertou a atenção dos que conduzem as instituições
ditas democráticas.
TRADIÇÃO
Nem a medieval Tradição, Família e Propriedade resistiu aos
tempos bolsonaros: a TFP rachou. O grupo no poder interno, encabeçado por
Sérgio Diniz na linha do precursor Plínio Correia de Oliveira, acha que um
outro, adversário, sabe como saiu do patrimônio, e para onde foi, uma
dinheirama sumida. A família já não está unida, vê-se que a propriedade já não
é garantida, mas uma certa tradição está viva e ativa.
A ARTE
Insultada por palavras sórdidas de um sujeito sórdido, Fernanda
Montenegro recebeu o afago
solidário, fosse explicitado ou não, de todos os que podem importar,
aqui, em algum sentido. A referência aparente na reação foi o fascínio pela
atriz, mas o que mais comoveu e moveu foi, com certeza, a pessoa, foi a mulher,
foi a claridade com que Fernanda Montenegro construiu 90 anos, a se completarem
na próxima quarta-feira (16), da árdua e brava arte da dignidade. E ainda nos
doou Fernandinha Torres, talento fenomenal.
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