Antes de
propor proteção a militares, Bolsonaro discutiu reprimir protestos
Bruno Boghossian, Folha de S. Paulo
No fim de outubro, Jair Bolsonaro disse
que havia conversado com o ministro da Defesa sobre a possibilidade de convocar
as Forças Armadas caso a onda de protestos vista no Chile se repetisse no
Brasil. "A gente se prepara para usar o artigo 142, que é pela manutenção
da lei e da ordem", afirmou o presidente.
Menos de um mês depois, o governo enviou ao Congresso um projeto
de lei, elaborado pelo Ministério da Defesa, que pode isentar militares de
punições por fatos que ocorram justamente em operações desse tipo.
A sucessão desses dois episódios mostra como o governo está
propenso a tratar medidas que deveriam ser excepcionais como atos corriqueiros.
Embora estabeleça regras aparentemente específicas, a proposta pode autorizar
integrantes das Forças Armadas a usarem meios letais de modo quase rotineiro.
A ideia do governo é expandir as circunstâncias em que agentes
podem atirar e até matar sem sofrer punição. Sob a alegação de legítima defesa,
o militar só seria punido se ficasse provado que ele cometeu excessos de
maneira intencional.
A medida é basicamente uma autorização indiscriminada para
atirar sem calcular as consequências. No contexto apresentado por Bolsonaro,
ela ainda põe em risco liberdades básicas dos cidadãos.
Como apontou Alberto Kopittke, diretor do Instituto Cidade
Segura, em artigo publicado na Folha, o projeto lembra o decreto editado na
Bolívia para conter os atos ocorridos após a derrubada de Evo Morales. Lá,
ficam isentos de responsabilidade militares que atuem no "restabelecimento
da ordem interna". Dezenas de pessoas já foram mortas na repressão aos
protestos.
O texto do governo brasileiro é tão abrangente que permite as
mais criativas interpretações. Além de não especificar que tipo de reação
excessiva pode ser considerada intencional, abre a porta para que praticamente
qualquer manifestante seja considerado perigoso, por ser "capaz de gerar
lesão corporal". O Congresso faria bem se engavetasse esse plano.
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