02 maio 2013

Polos extremos do consumo


Ao gosto do cliente, conforme o tamanho da conta
Luciano Siqueira

Publicado no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)

Outro dia um freguês da mesa ao lado, mesmo ressalvando que o assunto não é comigo, é com o Procon, desabafou: - Vice-prefeito, faz mais de mês que tento trocar o ventilador que a loja entregou errado e se recusa trocar. Comprei prateado e veio preto!

Dou-lhe toda a razão, recomendo que procure o doutor José Rangel no Procon e, de quebra, faço propaganda contra a loja, que ocupa sempre os primeiros lugares no ranking de reclamações dos consumidores no Recife.

E eis que me deparo agora com matéria publicada no Valor Econômico, emblemática dos dois pesos e duas medidas com que o consumidor é tratado – se um espécime de nossa sofisticada elite ou se um reles mortal.

Enquanto a loja de eletrodomésticos de clientela popular tudo faz para driblar os diretos do consumidor comum, a indústria de aviação paparica o ricaço à exaustão.

Segundo o jornal, a equipe de engenheiros de design de interiores de jatos executivos da Embraer é capaz de passar semanas inteiras dedicada a ajustes na composição de uma tinta até que alcance a tonalidade exata escolhida pelo cliente – que, no caso, deve ter desembolsado, no mínimo, US$ 1 milhão para comprar o jatinho.

Um diretor da companhia justifica tanto mimo em nome da concorrência pela preciosa fatia do mercado de "luxo inteligente", cujos clientes são extremamente exigentes, vão aos mínimos detalhes em busca da estética e do conforto.

Quem adquirir um jato Lineage, o modelo mais caro da empresa, por US$ 55 milhões, pode escolher entre 700 tipos diferentes de tecidos, 400 de couros, 60 de carpetes e quase seis mil configurações alternativas para a cabine.

Já o ventilador simples, que a loja não quer trocar, beira os 150 reais.

O contrate reflete a brutal disparidade de renda no Brasil. Os 20% mais ricos – que podem comprar carros de luxo, iates e aviões - concentram 57,7% do total da riqueza nacional, enquanto os 40% mais pobres – que trocam a geladeira ou compram o ventilador no sacrifício - detêm apenas 11%. Uns poucos alimentam o mercado de “luxo inteligente”; a maioria vive a aventura do consumo de massas.

Ambos – mercado de luxo e o popular – crescem no Brasil dos nossos dias. O de jatinhos de luxo, em particular, segundo a Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral), a frota brasileira de aeronaves gerais passou de 10.054, em 2000, para 12.310 unidades, em 2010. Destas, 540 são jatos, o que representa 4% da frota do País.

Já o mercado de eletrodomésticos populares vem evoluindo com picos entre 2000 e 2009, com crescimento de 18,9% em 2010 e em torno de 10% 2010 e 2012.

Ou seja, o Brasil cresce, mas o desenho da extrema desigualdade na distribuição da riqueza e da renda permanece. O que nos remete para a luta pelo desenvolvimento econômico com distribuição de renda e maior equilíbrio social.
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