O paradoxo (anti)político de Marina Silva
Marina Silva quer ser a opção política que está
fora da política; quer convencer o eleitor a votar em uma plataforma que não
poderá ser julgada no futuro.
João Feres Júnior e
Fábio Kerche, na Carta Maior
A repetição nas coisas
humanas já foi tema das reflexões de importantes filósofos e escritores. Os
historiadores antigos a tinham como certa, Maquiavel a viu como provável e
Marx, como farsa. A política eleitoral da democracia representativa
contemporânea, da qual nenhum desses autores tratou, não está livre dela,
tampouco. Como que constrangidos por um número limitado de scripts, seus
personagens reapresentam o que já foi visto e vivido em outros tempos, às
vezes, por outras gerações.
Esse parece ser o caso
da recém-escolhida candidata do PSB à presidência da república, Marina Silva.
O mantra entoado por
ela, já sabemos todos há bastante tempo, é o da negação da política
institucional em nome de convicções e ideais supostamente éticos. Não é a
primeira persona política na nossa vida recente a tomar esse caminho. Mas, como
ensinaram os antigos mestres dos quais falamos, o que é aparentemente ético
pode ser politicamente catastrófico.
Seguindo essa
estratégia, Marina Silva declarou recentemente: "Nosso compromisso é pelo
fim da reeleição. O meu mandato será um mandato de apenas quatro anos".
Pois bem, o fim da reeleição é uma bandeira que fala diretamente aos adeptos da
antipolítica, tão numerosos nos dias que correm.
Ela sintetiza vários
chavões que vemos repetidos frequentemente por aí nas vozes de cidadãos comuns,
de diferentes classes e ocupações.
O primeiro deles é a
imagem do político como um predador rapace, somente interessado em dar
continuidade, senão aumentar, o lucro que aufere por meio de corrupção.
O segundo é o do partido
que pretende se eternizar no poder, garantindo assim o fluxo de cargos públicos
e de dividendos da corrupção política para seus apaniguados. Segundo o
terceiro, a vontade de se reeleger induz o político no cargo a utilizar a
máquina pública para fins eleitorais. Seria, portanto, profundamente ético
acabar com a reeleição, pois estaríamos assim debelando essas mazelas.
Raciocínio melhor
podemos conceber, mas talvez não um que seja mais distorcido na compreensão do
funcionamento da democracia eleitoral, particularmente no que afeta seu caráter
democrático propriamente dito. Vejamos. Para começar, vamos descartar a posição
segundo a qual todos os políticos são igualmente ladrões cujo objetivo é
saquear os cofres públicos e enriquecer de todas as maneiras que se lhes apresentam.
Se isso fosse verdade, a democracia não seria mais que um total embuste, coisa
que nem mesmo Marina argumenta.
Assim, somos obrigados a
aceitar que existe uma diversidade de opções oferecida pela classe dos
políticos. Como em várias atividades, existem os que roubam, uns que roubam
mais do que os outros, aqueles que roubam bem pouco e, provavelmente, aqueles
que não roubam. Mas roubar está longe de ser a atividade mais importante
desempenhada por um político; há sua plataforma política, ideias, projetos,
valores, etc. Aqui também há diversidade: aqueles mais preocupados com o
social, outros com o mercado, empresários e investidores, alguns mais
estatizantes, outros mais liberais, e assim vai. Pois bem, em suma, só vale a
pena falar de eleição se a escolha (palavra sinônima) faz algum sentido.
Então, qual seria o
efeito da reeleição naquilo que toca a escolha?
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