Um tal de “Real”
Jéssica Barbosa*
Seu Manoel Luís dos Santos tinha 86
anos, e apesar de ser analfabeto, analisava e debatia com muita clareza
assuntos de questões sociais. Certa vez, voltando da faculdade, parei para
conversar com ele e o bate papo durou uns dez minutos. Nesse dia, não me recordo
exatamente o ano, Seu Manoel estava revoltado com um tal de “Real”.
“Boa tarde, Seu Manoel, que cara feia é
essa?” Perguntei com um sorriso no canto da boca tentando amenizar o clima
tenso.
Ele, sem titubear, respondeu antes
mesmo que eu terminasse a frase, como se estivesse esperando ansioso por alguém
para desabafar.
“Minha filha, estava aqui pensando em
como o dinheiro muda as coisas e principalmente as pessoas. Esse tal de
“Real" compra opiniões, caráter, amores e faz até com que famílias se
vendam. Sem falar que a saúde pública às vezes fica até com uma aparência de
primeiro mundo.”
“Eu concordo com o Senhor, mas porque
essa reflexão agora, aconteceu algo?”
“Tava assistindo uma reportagem e
cheguei à conclusão que fica muito complicado quando o Senhor "Real"
entra em cena e consegue calar a voz ou até mesmo mudar, em questão de
segundos, a opinião de uma pessoa. Um ser humano que se vende por migalhas não
tem o direito de cobrar ou argumentar o caráter do outro.”
Quando acabou de falar isso, ele foi
logo se levantando e dizendo que estava na hora de tomar o seu cafezinho. Me
agradeceu pela atenção e saiu.
Eu, além de voltar pra casa refletindo
sobre caráter e princípios, sai de lá com uma lição dada por Seu Manoel que
foi: por mais que as condições (financeiras) não estejam favoráveis, lembre-se
que, as coisas podem piorar ainda mais se você se entregar por migalhas ao
Senhor "Real".
É claro que eu não poderia terminar
essa crônica sem citar o querido Paulinho da Viola que sabiamente diz:
“Mas é preciso viver
E viver não é brincadeira não
Quando o jeito é se virar
Cada um trata de si
Irmão desconhece irmão
E aí dinheiro na mão é vendaval
Dinheiro na mão é solução
E solidão
Dinheiro na mão é vendaval
Dinheiro na mão é solução
E solidão”
*Jornalista
Nenhum comentário:
Postar um comentário