29 junho 2010

Meu artigo semanal no site da Revista Algomais

A glória ou o fracasso num detalhe
Luciano Siqueira


“Copa do Mundo é assim, tudo se decide num detalhe”, escutei ontem entre os muitos comentários sobre o que se tem passado na África do Sul no torneio mundial que mexe com a emoção de milhões em cinco continentes.

Afinal, disse certa vez o técnico Parreira, bombardeado por críticos de todas as estirpes que não compreendiam sua estratégia de ganhar a Copa de 1994 – como de fato ganhou – a partir do domínio absoluto do meio do campo: “o gol é o detalhe”. Quase o mundo desmorona. Como pode ser o gol um simples detalhe se tem o dom de nos transportar em segundos ao pódio dos vitoriosos ou à vala comum dos derrotados?

É que o detalhe – parecia ensinar o “filósofo Parreira” – é produto de um sem número de variáveis, contém um sentido universal, embora aparentemente mínimo. Aliás, Engels, companheiro de Marx na fundação do materialismo histórico, escreveu sobre o peso do detalhe – ou do fato fortuito – na alteração do curso dos acontecimentos na vida de um país a ponto de alterar a sua trajetória.

Há quem afirme, com certa razão, que o “detalhe” que infernizou a vida de Fernando Collor e provocou o seu impeachment teria sido a tentativa do então presidente de assumir o controle acionário de uma das redes de TV. O suficiente para que a Globo e outros poderosos órgãos de comunicação, incluindo a ultra-reacionária Veja, fossem a cata de um fato que pudesse ser explorado como o fio da meada de tudo o que o agora inimigo passou a representar. Pedro, o irmão insatisfeito, deu a munição necessária fazendo revelações tidas à época como comprometedoras.

Na vida de nós outros, simples mortais, também não é assim? No amor, então, a palavra pronunciada no momento errado, o gesto não compreendido... e vai-se tudo ladeira abaixo! “Um detalhe, cara, que ela não compreendeu e foi como um vaso de porcelana chinesa que se espatifou”, registrei numa crônica a partir do diálogo com um desconhecido com dores de cotovelo no salão de embarque do aeroporto.

Voltando à Copa. Essa da África do Sul tem sido rica em detalhes que fazem a glória ou o fracasso de times poderosos ou de personagens isoladas. No jogo Inglaterra versus Alemanha, o gol de Lampard, que o juiz não viu, poderia ter alterado o andamento da partida e o resultado final. Não fosse a parafernália tecnológica que nos permite olhar o mesmo lance por mil ângulos e constatar, em detalhes, o que de fato aconteceu, talvez tivesse pairado dúvida sobre se a bola havia ou não ultrapassado a linha – e salvo, pelo menos parcialmente, a reputação do árbitro uruguaio Jorge Larrionda. Mas o detalhe da jabulani a trinta e sete centímetros da linha o converteu em protagonista de um dos erros mais clamorosos da história das Copas.

Sei não. Penso que na reta final que se aproxima, onde disputam os grandes, a vitória ou a derrota vai depender de um erro nosso ou do adversário. Portanto, de um detalhe.

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