07 julho 2011

Meu artigo semanal no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)

Marlon Brando e as eleições metalúrgicas em Pernambuco
Luciano Siqueira


Uma premissa da boa prática democrática em toda eleição é a lisura, irmã gêmea da transparência e da igualdade de disputa. Vale para eleições institucionais, vale também – tanto quanto – para eleições sindicais. Aliás, numa perspectiva libertária, onde não pode haver sequer suspeita de irregularidade, sob nenhuma hipótese, é precisamente no ambiente dos sindicatos, justo porque frequentado pela parcela mais esclarecida do segmento de classe historicamente destinado ao papel de vanguarda da transformação social.

Daí ser lamentável o que ocorre agora no Sindicato dos Metalúrgicos de Pernambuco, cujo pleito é objeto de pedido de impugnação da parte da oposição porque, entre outras barbaridades, a relação de votantes emitida pela Comissão Eleitoral do Sindicato mostra-se enxertada por centenas de eleitores não sindicalizados.

De certa forma a anomalia não surpreende, tamanho o grau de burocratização e de distanciamento da entidade de sua base, sob o comando atual. Predomina a concliação sem princípios com o patronato, comprometendo bandeiras de lutas fundamentais dos trabalhadores e substituindo a mobilização pelo conchavo, muitas vezes em troca de benesses por todos os títulos condenáveis.

É o que se ouve na porta das fábricas e nas concentrações de operários que na madrugada se deslocam para os canteiros de obras e para as linhas de produçção instalados em Suape. Na solenidade de batismo do navio João Cândido, em maio passado, com a presença do então presidente Lula, o repúdio dos trabalhadores se fez ouvir por estrondosa vaia ao atual presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, conhecido pela alcunha de Betão, que não conseguiu sequer ser ouvido.

Lembra o clássico norte-americano de Elia Kazan, protagonizado por Marlon Brando, “On the Waterfront” (na tradução brasileira “Sindicato de ladrões”). Mais do que o roteiro perfeito, a direção impecável, o uso competente do contraste claro-escuro em película preto e branco, a locação e enquadramento de algumas cenas marcantes e o desempenho inesquecível de Brando – que fazem do filme um dos melhores de todos os tempos -, impressiona o registro fiel de um sindicato viciado, monopolizado por um grupo violento e inescrupuloso que, na vida real, sob a liderança da poderosa central AFL-CIO, tem servido de modelo mundo afora. Inclusive para uma parte do sindicalismo brasileiro, originariamente de esquerda, que após suplantar o peleguismo construído à sobra do regime militar, aos poucos se acomodou ao aparelho e à burocracia, forjando sua própria versão pelega.

Kazan e Brando ganharam o Oscar. O grupo que pretende se eternizar na direção do Sindicato dos Metalúrgicos oxalá seja obrigado, por decisão judicial, a se submeter ao crivo da categoria sem as artimanhas nem as irregularidades que o torna assemelhado à turma de Johnny Friendly (interpretado por Lee J. Cobb) e Charley Malloy (Rod Steiger) e que a maioria opte pela oposição, tal como na cena final do filme, em que Terry Malloy (Marlon Brando), acolhido pelos seus companheiros, rompe com as regras discricionárias impostas aos que não rezavam pela cartilha da gang.

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