Denúncia de Veja, repercutida em 4 minutos e 42 segundos do Jornal Nacional, faz lembrar a ofensiva midiática de 2006
Por
Luiz Carlos Azenha, no blog Viomundo
O
“novo escândalo” da Veja, sobre suposto vazamento de perguntas - que de
qualquer forma seriam públicas - aos que foram ouvidos na CPI da Petrobras me
parece uma manobra diversionista para mudar de assunto. Tirar o noticiário de
Cláudio e Montezuma e trazer Dilma Rousseff mais uma vez para o domínio
absoluto das manchetes.
Quando
eu era repórter da TV Globo, em 2005, antecedendo minha primeira cobertura de
eleições presidenciais no Brasil - havia morado quase duas décadas nos Estados
Unidos -, uma investigação que fizemos sobre caixa 2 em Goiás acabou em uma das
CPIs que trabalhavam simultaneamente em Brasília.
Vi com
meus próprios olhos uma importante jornalista da Globo, de alta patente, que me
ciceroneava em um ambiente desconhecido, visitando gabinetes de deputados e
senadores para troca de informações. No do então deputado ACM Neto, que
participaria do depoimento do homem investigado por nós, houve até entrega de
documentos e sugestão de perguntas. Eu vi isso acontecer e, francamente, não me
espantei.
Se o
objetivo de uma CPI é esclarecer os fatos, não há perguntas, nem assuntos
secretos. Os depoentes devem trazer todos os esclarecimentos que forem
necessários à opinião pública. A existência de parlamentares de diferentes
correntes políticas é garantia de que teremos todo tipo de pergunta, das
“levantadas de bola” às “pegadinhas”, das críticas às bajuladoras. Não há
motivo para guardar nenhuma informação em sigilo, se se pretende de fato
esclarecer o assunto.
Qual é
o problema de perguntas serem organizadas para facilitar os esclarecimentos do
depoente? Isso não significa que ele vá responder apenas àquelas perguntas, já
que a oposição estará presente. O problema está nas mentiras do depoente, não
nas perguntas feitas a ele. Não há nada de errado quando um governo tenta
vender à opinião pública sua versão dos fatos, desde que a oposição possa,
igualmente, fazê-lo. Vamos combinar que não falta espaço na mídia à oposição
brasileira, certo?
Portanto,
trata-se de uma denúncia tola, transformada em manchete por uma gravação
subterrânea, vendida como “comprometedora”.
O que
me chamou a atenção naquela CPI de 2005, na verdade, foi que o homem por nós
investigado, dono de uma seguradora, quando abriu os arquivos em seu depoimento
deixou claro que havia feito doações por fora a todos os partidos políticos,
não só ao PT mas também ao PSDB, PMDB, PFL e outros. Assim que isso ficou
explícito e demonstrado, acabou nossa investigação. Fui mandado de volta a São
Paulo…
Naquele
período eleitoral, também constatei por dentro a mecânica da mídia: denúncia na
capa da Veja entre sexta e sábado, repercussão acrítica no Jornal Nacional de
sábado, bola rolando a partir de domingo na Folha, Estadão e O Globo.
Não
foi o que se chama de “nota pelada” do Jornal Nacional, algo passageiro, sem
imagens, na edição de ontem. Foram 4 minutos e 42 segundos falando sobre a
denúncia de Veja, uma enormidade! Se fosse em comerciais, teria um custo
próximo dos R$ 4 milhões. Frequentemente, quando eu era correspondente em Nova
York, precisava explicar assuntos complexos, como a crise que precedeu a
invasão do Iraque, em 60 segundos.
O que
a Globo fez ontem se chama no meio jornalístico de “dar pernas” a uma denúncia.
Eu
mesmo, num plantão, fui convocado para fazer uma destas “reportagens”, que
envolvia um irmão do então presidente Lula. Argumentei com meu chefe direto que
seria impossível fazer uma apuração independente do conteúdo da revista.
Estávamos dando tudo aquilo como límpido e verdadeiro. O certo seria fazer
nossa própria apuração a partir dos dados trazidos pela Veja. E se as
informações não se confirmassem? Resposta dele: é isso mesmo, é apenas para
reproduzir trechos da revista.
Foi
nesse quadro que, mais tarde, houve um revolta interna na redação da Globo de
São Paulo, que envolveu um grande número de profissionais, resultou na demissão
de Rodrigo Vianna e, mais tarde, influenciou minha decisão de pedir rescisão
antecipada de meu contrato, que venceria quase dois anos depois, para estudar
internet nos Estados Unidos. Não me arrependo e, a julgar pelo que aconteceu
neste fim-de-semana, vejo que o método da mídia corporativa não mudou. Saiu na
capa de Veja, teve grande repercussão no Jornal Nacional e…
A
suspeita que eu tinha então agora está desfeita. Não duvido mais que seja tudo
combinado. Se não fosse, por que a denúncia da Folha sobre o aeroporto de
Cláudio não detonou imediatamente o mesmo rolo compressor investigativo?
Talvez
a existência dos blogs e das redes sociais tenha acabado com as mentiras mais
deslavadas. A manipulação da mídia corporativa agora é exercida na escolha da
pauta e nos recursos direcionados para apurar este ou aquele assunto, de acordo
com as conveniências políticas, econômicas ou ideológicas. De volta a 2006!
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