FHC e a arte de se apequenar antes e depois
Luis Nassif, em seu blog
Perguntam-me
dos motivos para a implicância com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
São
vários.
O
principal é que tinha base de apoio no seu partido, conhecimento, descendia de
família de militares que participaram de episódios centrais de formação do
país; tinha formação e adesão de parcelas importantes da opinião pública para
montar um governo socialdemocrata, que conduzisse reformas mas lançasse as
bases de políticas sociais legitimadoras. Tinha tudo, até a assessoria luxuosa
da verdadeira estadista que era dona Ruth para lançar as bases do combate à
miséria.
Em
vez disso, terceirizou a política econômica para os financistas do seu governo,
permitiu a manutenção de políticas cambial e monetária ruinosas, mesmo após
três graves crises externas. Jamais conseguiu pensar como um verdadeiro
estadista. Era deslumbrado com as pompas do poder, mas não com a possibilidade
de mudar realidades.
Fora
do poder, poderia ter se tornado um desses sábios referenciais dos quais toda
Nação necessita, os mais velhos que trabalham para mostrar rumos, para
conciliar, para ajudar na construção de consensos.
Pequeno
antes, manteve-se pequeno depois.
Seu
artigo de hoje, no Estadão (clique aqui), é tão medíocre que merecia
ser assinado por Roberto Freire – o único (repito o único!) Senador da
República que, em 1999, foi contra o projeto de renda mínima proposto em comum
acordo por ACM e Eduardo Suplicy.
É
medíocre por ser falsamente esperto, e pela absoluta falta de respeito de FHC
pelos fatos e pela sua própria biografia.
Diz o
artigo:
“O
que fez o PSDB quando as pesquisas eleitorais de 2002 apontavam para a possível
vitória do PT?”.
1.
Elevou os juros, mesmo antes das eleições, reduzindo as próprias chances eleitorais.
Coloca
como se fosse um ato de desprendimento e não um gesto de desespero, ante os
erros colossais cometidos pelo então presidente do Banco Central Armínio Fraga,
que jogou a cotação do dólar nas alturas e quase explodiu com a economia
brasileira.
Primeiro,
Armínio criou o sistema de pagamento eletrônico, que passou a medir de forma
muito mais intensa os movimentos de juros intrabanco e as cotações dos títulos
do Tesouro. Depois, introduziu o sistema de “marcação a mercado” – pelo qual os
fundos tinham que contabilizar diariamente suas cotas pelo valor de negociação
dos títulos a cada dia.
Exemplo
pequeno:
· um
título vale 100 no momento de resgate; a taxa de juros do mercado está em 10%.
Logo o valor presente do título é 90,9. Ou seja, se alguém comprar por 90,9 e
levar até o dia do vencimento, receberá os 100.
· ai
a taxa aumenta para 15%. Imediatamente o valor a mercado do título cairá para
86,8 – para garantir os 15% de juros no vencimento.
Mesmo
que os fundos levassem os títulos até o vencimento, para receber os 100, a nova
regra obrigava-os a remarcar o valor da cota de acordo com o valor de
negociação diária dos títulos.
Finalmente,
lançou uma operação desastrosa de vender títulos pré-fixados amarrados a hedge
cambial – visando empurrar goela abaixo do mercado os pré-fixados, em uma
atitude de um voluntarismo tal que nada fica a dever às medidas de Dilma
Rousseff, e muito mais ruinosa.
Os
investidores passaram então a comprar o pacote, a ficar com o hedge e a desovar
os pré-fixados no mercado. Esses títulos eram uma parcela ínfima do estoque de
pré-fixados do mercado. Mas o valor das cotas de todos os papéis dependia das
negociações diárias.
Quando
os pré-fixados foram desovados no mercado, houve queda de sua cotação e
imediatamente todos os fundos que tinham pré-fixado em carteira foram
obrigados, pela marcação a mercado, a desvalorizar o valor de sua cota. Da
noite para o dia, investidores se deram conta de que havia caído o saldo de
suas aplicações nesses fundos.
Foi
um pânico generalizado no mercado, que ajudou a fortalecer o falso temor de
que, eleito, Lula confiscaria a poupança.
Foi
uma barbeiragem tão grande que em muitas cabeças passou a impressão de ter sido
intencional, para espalhar o temor nas eleições que se avizinhavam.
As
medidas posteriores foram mero paliativo para impedir que a economia explodisse
nas mãos de FHC como consequência dessa barbeiragem.
2.
Sustentou mundo afora que não haveria perigo de irresponsabilidade de Lula,
pois as leis e cultura haviam mudado.
FHC
baseia-se em uma versão falsa de ter conduzido a aproximação de Lula com o
governo Bush Jr, conforma devidamente desmascarada aqui por pessoas que
participaram diretamente das reuniões prévias. O principal homem de FHC em
Washington, embaixador Rubens Barbosa, sempre acenou com fantasmas para o
Departamento de Estado norte-americano.
3.
Pediu empréstimo ao FMI, com previa anuência dos candidatos.
Mas é
óbvio que o FMI só emprestaria com aval do futuro presidente. Não se tratou de
concessão, mas de um ato de moratória, quatro anos após o anterior, devido ao
fato de adiar a tomada de medidas urgentes para não atrapalhar as eleições -
prática que ele aponta em Dilma, em seu artigo.
FHC
termina o artigo prevendo tempos duros, de autoritarismo e repressão.
E
conclui: “Vejo fantasmas? Pode ser, mas é melhor cuidado do que não lhes dar
atenção”.
É por
essas e outras que jamais será a figura reverencial que poderia ter sido,
depois de deixar o poder.
Comprova
o pior receio de Sérgio Motta quando, pouco antes de morrer, mandou um bilhete
implorando: “Não se apequene”.
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Um comentário:
FHC, o que era pra ter sido e não foi...
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