Reforma política é oportunidade histórica para um novo pacto social
Vanessa Grazziotin, na Folha de S. Paulo
A grave situação do Brasil nos obriga a
uma análise profunda sobre a luta política e os conflitos de interesses
econômicos que movem e alimentam tão prolongada crise.
Precisamos repensar as relações e o
nosso ordenamento político-institucional, apresentar alternativas, agir com
coragem e determinação, quebrar mitos, paradigmas e sobrepor a essência à
aparência.
Um tema fundamental é a reforma
política, visto o esgotamento do atual modelo, um híbrido genuinamente
brasileiro, com forte predominância do poder econômico, campanhas milionárias e
fragilização dos partidos.
Pesquisa do Instituto Locomotiva aponta
que 84% da população não se sente representada por nenhum partido político,
evidenciando o divórcio entre a sociedade, os políticos e os partidos.
A inadiável reforma política é uma
janela de oportunidades para um salto democrático, que garanta igualdade de
oportunidades, diversidade na representatividade e transparência.
Partir da premissa de que o problema
está na quantidade exagerada de partidos (de fato uma deturpação) ou nas
coligações é não só um equívoco mas um escapismo que visa manter os pilares
dessa estrutura carcomida.
Se não se faz política institucional
sem partido ou organização política (como queiram), é necessário criar um
sistema eleitoral que valorize os programas, as propostas e ideias das
diferentes correntes ideológicas.
Significa refundar os partidos.
Possibilitar ao eleitor votar num programa e não em "chefetes", que
se autoproclamam "independentes" para mascarar seu apetite
fisiológico.
Uma das propostas mais antigas, que
vigora em vários países, é o sistema de lista pré-ordenada, que estabelece
critérios mais democráticos, respeita a composição da sociedade e garante
alternância de gênero. Ainda amplia a democracia interna, o debate de ideias e
programas. No Brasil, a medida reduziria e ajudaria a superar o vexatório 148º
lugar em participação feminina no Legislativo.
Hoje se vota num candidato e se elege
outro. Com a lista –que será pública–, esse risco não existirá. Se um programa
ou quem encabeça a lista não lhe agrada, você simplesmente não vota naquela
lista. Ninguém se "esconderá atrás das listas".
Esse sistema, combinado com um fundo de
financiamento democrático, evitará a relação promíscua entre agentes públicos e
privados, que tem sido a base da corrupção.
A oportunidade é histórica para um novo
pacto social que envolva todos os segmentos, aprofunde a democracia, amplie os
espaços institucionais, torne menos desiguais os pleitos e supere o apartheid
imposto pelo poder econômico contra as mulheres, os negros e pobres.
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