30 novembro 2017

Uma crônica para descontrair

Leitura de bordo
Luciano Siqueira, no Vermelho

É sempre assim, mesmo em viagens curtas: leio e escrevo sempre. Pelo prazer em desvendar o sentido das coisas e, confesso, para evitar a conversa nem sempre agradável de quem viaja no assento ao lado.

De viajantes incômodos tenho boa experiência acumulada. Tanto que desenvolvi modos próprios de me desvencilhar deles. 

Mas nem sempre com sucesso.

Como da vez que, por descuido imperdoável, admiti ser (ou ter sido) médico. O que me rendeu longa e entediante conversa com a jovem primípara, que me bombardeou com perguntas intermináveis sobre o futuro parto e cuidados com recém-nascidos. 

Ou quando eu lia 'O velho e o mar', de Ernest Hemingway, e o cidadão ao lado, que se dissera missionário evangélico (sem que eu o perguntasse), a ensaiar perguntas sobre a "terceira idade" e as praias do Nordeste!

Diante do meu evidente mau humor, enfim se tocou, cessaram as perguntas impróprias, porém me pediu "um livro para que eu também leia, se o senhor tiver aí". Vinguei-me passando às mãos do dito cujo um exemplar de 'Salário, preço e lucro’, de Karl Marx, que folheou, tentou ler algumas passagens e logo me devolveu.

Pois bem. Melhor mesmo é, tão logo me acomodar na aeronave, sacar da pasta um livro ou o iPad e me dedicar ao prazer solitário da leitura ou da escrita.

Agora mesmo manuseei rapidamente a revista da Gol e a refuguei de pronto.

O manuseio se prende às fotos, muito boas, que ilustram algumas matérias.

O refugo fica por conta da absoluta inutilidade (para mim) dos textos, um misto de "autoajuda" para empresários ou pretendentes a tal e, à guisa de reportagem, propaganda de hotéis e restaurantes de luxo.

Com licença da nostalgia, registro em ata minha saudade dos tempos em que líamos nas revistas de bordo gente como Luís Fernando Veríssimo e outros do mesmo naipe. Ótimas crônicas, puro deleite. 
Hoje em dia parece que os editores dessas revistas nos tratam como leitores frívolos, desprezíveis e meros consumistas. 

Verdadeiro oásis é alguma entrevista ocasional com personagem digno de atenção, como o ator Lázaro Ramos, por exemplo, que pude ler alguns meses atrás.

Feito o registro, dêem-me licença que vou concluir a leitura de 'Sobre a China', de Henry Kissinger e encarar o novo romance de Milton Haroum, 'A noite da espera'.

Boa viagem!


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