Xadrez dos rumos do
fascismo à brasileira
Luís Nassif,
Jornal GGN
Peça
1 – os ciclos da história
Desde
o Plano Cruzado me interessei pelos ciclos históricos, pela maneira caprichosa
com que os fatores históricos vão sendo tecidos e os eventos se repetem, com
cem anos de diferença, mas seguindo a mesma lógica férrea. Explano essa
processo no meu livro “Os cabeças de planilha”.
Quem
primeiro me chamou a atenção foi a leitura de “América Latina, males de
origem”, do médico, psicólogo, historiador Manuel Bonfim.
Admirador
da revolução americana, descreveu logo após a República o que seria o desenho
de um país moderno e sua decepção com a República que se desenhava no país.
Especialmente com a maneira como o Brasil naufragou com o encilhamento e o jogo
político dos financistas.
Justamente
por mudar o foco dos males nacionais, do mito da sub-raça (que ele desmontou,
como médico) para o da sub-elite, acabou ignorado pela geração seguinte de
brasilianistas, de Gilberto Freyre a Sérgio Buarque de Holanda.
Essa visão dos
ciclos é essencial para entender a quadra atual do mundo e do Brasil, o advento
do fascismo em suas diversas formas.
Em
meados do século 19 e início do século20 ganham forma as grandes inovações
tecnológicas, especialmente nos meios de transporte e nos serviços públicos.
Essas inovações permitem a notável expansão do capital financeiro, mas, ao mesmo
tempo, provocam terremotos nas atividades tradicionais, levando insegurança a
todos os setores.
Como
descreve Madeleine Albright no beste-seller “Fascismo, um alerta”:
Invenções
espantosas como a eletricidade, o telefone, o automóvel e o navio a vapor aproximavam
o mundo, mas essas inovações deixavam milhões de fazendeiros e trabalhadores
manuais sem emprego. Por toda parte, pessoas estavam em movimento. Famílias de
trabalhadores rurais se amontoavam nas cidades e milhões de europeus levantavam
acampamento e cruzavam o oceano. Para muitos dos que ficavam, as promessas
inerentes ao iluminismo e às Revoluções Francesa e Americana haviam se
esvaziado.
No
plano internacional, além disso, vivia-se o advento de uma nova potência
industrial, os Estados Unidos, desequilibrando o jogo de poderes na Europa. E o
modelo de articulação entre as nações, a Liga das Nações, não mais conseguia
administrar os conflitos entre as partes.
A
Velha República esboroa-se no Brasil e em todas as partes do mundo. Na Europa,
a crise decreta o fim das dinastias monárquicas que dominavam os países mais
relevantes.
Cem
anos depois, o modelo financista esgota-se com a crise de 2008. Em outros
tempos, cederia espaço à socialdemocracia. Mas, na Europa, a socialdemocracia
agonizava, devido às enormes concessões feitas à financeirização. Em 2010, a
única esperança de revitalização da socialdemocracia era Lula, recém-saído de
um governo vitorioso.
É
esse quadro que provoca, tanto há cem anos, quanto agora, o fim do modelo de
democracia restrita, abrindo espaço para as lideranças agressivas, populistas,
primárias, brandindo discursos de ódio.
Peça 2 – psicologia do fascismo
Esse é o
tema principal do livro de Madeleine Albright. Além das comparações históricas,
Albright se dedica a dissecar a psicologia do fascismo, a partir dos exemplos
maiores – Hitler e Mussolini -, mas também dos partidos de extrema-direita que
aparecem nos Estados Unidos, Inglaterra e França.
O medo como fator impulsionador
O
medo é a razão de o alcance emocional do fascismo se estender a todos os níveis
da sociedade. Não existe movimento político que floresça sem apoio popular ,
mas o fascismo depende tanto dos ricos e poderosos como do homem ou da mulher
da esquina – dos que têm muito a perder e dos que não têm nada. Essa colocação
nos fez pensar que talvez o fascismo deva ser visto menos como ideologia
política e mais como forma de se tomar e controlar o poder.
Na
Itália dos anos 1920, por exemplo, havia autodeclarados fascistas de esquerda
(que advogavam uma ditadura dos despossuídos), de direita (que defendiam um
Estado corporativista autoritário) e de centro (que lutavam pelo retorno a uma
monarquia absolutista).
Na
origem da formação do Partido Nacional-Socialista Alemão (Nazista) há uma lista
de reivindicações com apelo a antissemitas, anti-imigrantes e anticapitalistas,
mas que defendia também pensões mais altas aos idosos, mais oportunidades
educacionais aos pobres, fim do trabalho infantil e melhorias no sistema de
saúde para as mães. Os nazistas eram racistas e, na cabeça deles, ao mesmo
tempo reformistas.
Enquanto
uma monarquia ou uma ditadura militar são impostas à sociedade de cima para
baixo, a energia do fascismo é alimentada por homens e mulheres abalados por
uma guerra perdida , um emprego perdido , uma lembrança de humilhação ou a
sensação de que seu país vai de mal a pior . Quanto mais dolorosa for a origem
da mágoa, mais fácil é para um líder fascista ganhar seguidores ao oferecer a
expectativa de renovação ou prometer restituir - lhes o que perderam.
O fascismo de Trump
Nesse
processo , aviltou sistematicamente o raciocínio político nos Estados Unidos ,
exibiu um desprezo impressionante pelos fatos , caluniou predecessores ,
ameaçou “ encarcerar ” rivais políticos , referiu - se aos jornalistas da
grande mídia como “ inimigos do povo americano ” , espalhou mentiras sobre a
integridade do processo eleitoral do país , promoveu de forma impensada uma
política comercial e econômica nacionalista , vilanizou imigrantes e os países
de onde vieram e alimentou uma intolerância paranoica direcionada aos
seguidores de uma das principais religiões do mundo
A violência e a hipocrisia
(Mussolini)
aceitava dinheiro de grandes corporações e bancos, mas falava a língua dos
veteranos e dos trabalhadores. (...) Como o clima político continuava a piorar,
teve de tornar-se cada vez mais militante só para manter-se em compasso com as
forças que alegava comandar. A um repórter que lhe pediu para resumir seu
programa, Mussolini respondeu: “É quebrar os ossos dos democratas... e quanto mais
cedo, melhor”.
(...)
Discursando em praças, cervejarias e tendas circenses, Hitler se utilizava
repetidamente dos mesmos verbos de ação – esmagar, destruir, aniquilar, matar.
Sua rotina era gritar até espumar de fúria, vociferando em meio ao agitar de
braços contra os inimigos da nação.
A ditadura dentro do devido processo legal
Em
1924 , Mussolini forçou a aprovação de uma lei eleitoral que entregava aos
fascistas o controle do parlamento . Quando o líder socialista apresentou
provas de que a votação fora fraudada , foi raptado por bandidos e assassinado
. Ao final de 1926, Il Duce já havia abolido todos os partidos políticos
concorrentes, acabado com a liberdade de imprensa, neutralizado o movimento
trabalhista e reservado a si mesmo o direito de nomear autoridades municipais.
(...) Assumiu o controle da polícia nacional, expandiu-a e multiplicou sua
capacidade de conduzir a fiscalização interna. Para sufocar a monarquia,
reivindicou o poder de aprovar o sucessor do rei. Para apaziguar o Vaticano,
mandou fechar os bordéis e aumentar os ganhos dos padres, mas em troca ficou
com o direito de aprovação dos bispos.
(...)
Aos 43 anos, (Hitler) fez um apelo aos parlamentares por confiança, na
esperança de que não pensariam muito a fundo antes de votarem o próprio
epitáfio. Sua meta era assegurar a aprovação de uma lei que o autorizasse a
ignorar a Constituição, passar por cima do Reichstag e governar por decreto.
Garantia a seus ouvintes que não tinham nada com que se preocupar; seu partido
não tinha a intenção de minar as instituições alemãs. (...) Poucas
semanas depois, os partidos políticos que colaboraram haviam sido abolidos, e
os socialistas, presos. O Terceiro Reich havia começado.
O início das ditaduras fascistas
(Hitler)
Começou pela abolição das assembleias locais e pela substituição dos
governadores das províncias por nazistas. Enviou valentões da SA para
brutalizar adversários políticos e, quando necessário, despachá-los para os
recém-abertos campos de concentração. Deu cabo dos sindicatos ao declarar o 1o
de maio de 1933 feriado nacional sem desconto em folha e então ocupar as sedes
dos sindicatos país afora no dia 2. Expurgou o serviço público de elementos
desleais e emitiu um decreto banindo judeus de profissões. Pôs a produção
teatral, musical e cinematográfica sob o controle de Joseph Goebbels e impediu
jornalistas não simpatizantes de trabalhar. Para garantir a ordem, consolidou
numa nova organização, a Gestapo, funções policiais, políticas e de inteligência.
Como o sistema os recebia
Destilava
seu escárnio pelos comunistas, estratégia que lhe valeu amigos na comunidade
financeira e cobertura favorável em alguns dos maiores veículos de imprensa do
país.
(...)
O establishment político do país – grandes empresários, militares e Igreja –
descartara inicialmente os nazistas como um bando de brutos gritalhões que
jamais atrairiam o apoio das massas. Com o tempo, passaram a enxergar valor no
partido como bastião anticomunista, mas nada além. Não tinham metade do medo de
Hitler que deveriam ter. Subestimavam-no em razão da falta de estudo e se
deixavam levar por suas tentativas de cativá-los. Ele sorria se fosse preciso e
certificava-se de responder-lhes às perguntas com mentiras tranquilizadoras.
Para a velha guarda, era claramente um amador com uma ideia exagerada de si,
improvável de manter-se popular por muito tempo.
Rádio e Internet
O
Führer foi o primeiro ditador capaz de atingir 80 milhões de pessoas num único
instante com um chamamento à união. O rádio era a internet dos anos 1930, mas,
como meio de comunicação de mão única, mais fácil de controlar. Jamais estivera
disponível ferramenta tão eficiente para manipular a mente humana.
As mulheres do lar
Ao
tomar posse, Hitler quase que de imediato retirou mulheres de funções
burocráticas, prometendo “emancipá-las da emancipação”. Eram aconselhadas a
cuidar da lareira, fazer remendos, costurar, cozinhar apfelkuchen [tortas de
maçã] e dar à luz uma nova geração de super-homens arianos.
A globalização
O
ímpeto globalizante atordoava a muitos e os levava a buscar refúgio na toada
familiar das noções de nação, cultura e fé; e, por toda parte, pessoas pareciam
em busca de líderes que trouxessem respostas simples e satisfatórias às
perguntas complicadas da modernidade.
O fascismo na Inglaterra
Sir
Oswald Mosley , um intrépido inglês com um bigode escovinha de fazer inveja a
Hitler , libido comparável à do Duce e o que uma colega definia como “
arrogância esmagadora e convicção inabalável de ter nascido para reinar ” , era
alguém que se via em tal papel .
De
volta a Londres , Mosley fundou a União Britânica de Fascistas ( BUF , na sigla
em inglês ) , com uma plataforma que abarcava o característico programa de
obras públicas , anticomunismo , protecionismo e libertação da Grã - Bretanha
de estrangeiros , “ sejam hebreus ou qualquer outro tipo de forasteiro ” . À
imagem e semelhança do Duce , recrutou uma força de segurança de aparência
ameaçadora , ensinou - os a fazer a saudação romana e distribuiu - lhes camisas
pretas inspiradas no modelo de seus uniformes de esgrima . Em 1934 , os
comícios de Mosley atraíam multidões de trabalhadores , comerciantes ,
empresários , aristocratas , membros descontentes do Partido Conservador e um
punhado de repórteres , soldados e policiais de folga .
O fascismo na França
Na
França , o Solidarité Française , com suas camisas azuis , foi um dos vários
grupos de direita a digladiar com a esquerda : assumidamente pró - nazista ,
fez campanha com o slogan “ A França para os franceses ” e foi banido pelo
governo socialista em 1936 .
O fascismo nos EUA
O
escritor autodidata William Pelley fundou a Silver Legion of America em janeiro
de 1933, poucas horas após Hitler ascender ao posto de chanceler da Alemanha.
Sediada em Asheville, na Carolina do Norte, atraiu cerca de 15 mil filiados.
Seus seguidores usavam calças azuis e camisas prateadas com um “L” escarlate
acima do coração, que significava Love, Loyalty and Liberty (Amor, Lealdade e
Liberdade). Os camisas prateadas militavam pelo antissemitismo e buscavam
reproduzir o modelo nazista de vigilantismo. (...) Em 1936, Pelley foi
candidato à presidência com o slogan “Fora, vermelhos, fora, judeus”, mas seu
nome só esteve na cédula do estado de Washington e recebeu menos de 2 mil
votos. Os camisas prateadas não tardaram a desaparecer, mas os preconceitos que
disseminaram encontraram eco em organizações como a Ku Klux Klan e nas
transmissões em rede nacional do padre Charles Coughlin, polêmico radialista
isolacionista de Detroit.
Peça 3 – o fascismo à brasileira
O
fascismo à brasileira transcende a figura de Jair Bolsonaro. Há uma fase de
transição, já em andamento, que definirá o desfecho dessa trajetória política
do fascismo.
Com
as devidas ressalvas, já que o país atravessa uma fase de profunda
irracionalidade, com a besta solta nas redes sociais e nas ruas, é possível
delinear alguns desdobramentos do governo Bolsonaro. Principalmente quando o
governo estiver em andamento e as expectativas do eleitorado não forem
atendidas.
Os fundamentalistas
Pessoalmente,
Jair Bolsonaro é uma personalidade vulnerável psicológica, intelectual e
socialmente. Depende, em tudo, dos filhos.
Dos
seus quatro filhos, um é apolítico, dois são baixo clero de pequena ambição e o
quarto, Eduardo, é o megalomaníaco. Tem ideias grandiosas, ambiciona suceder o
pai. Assim como um Duce tupiniquim, acredita piamente na sua intuição e nas
asneiras que repete. E tem seguidores que também acreditam.
É
de sua responsabilidade a parte mais non-sense do Ministério: o inacreditável
chanceler Ernesto Araújo, o Ministro da Educação Ricardo Veléz e a Ministra de
Direitos Humanos Damares Alves. A mediocridade de seu círculo de
influência mostra um político de tiro curto.
Pela
lógica interna do governo, dada pelo núcleo mais racional, o dos militares, não
se espere longa vida dos fundamentalistas, especialmente do Ministro das
Relações Exteriores. Trata-se de um bajulador que assimilou as pirações
fundamentalistas dos Bolsonaro por puro oportunismo e monta um jogo de cena
mirando exclusivamente a falta de discernimento dos Bolsonaro sem se importar
com as consequências para o país.
Ocorre
que o MRE terá uma função chave, para complementar as estratégias econômicas do
futuro Ministro da Economia Paulo Guedes. Em poucos meses, mesmo antes de
começar o governo as declarações de Ernesto e Jair têm produzido terremotos na
imagem do Brasil no exterior. Possivelmente, nem nos tempos da Albânia, da
Coreia do Norte, estados nacionais conseguiram produzir uma dupla tão
ridiculamente atemorizante quanto o duo Jair-Ernesto. Esse estilo rede social é
totalmente incompatível com qualquer projeto sério de país, de direita ou
esquerda.
Não
se tenha dúvida que partirá de Eduardo o primeiro grande trauma político do
governo Bolsonaro.
Os catões
A posse de Bolsonaro, no dia
1º de janeiro, marcará formalmente a transmutação da Lava Jato de agente
desestabilizador para co-participante do banquete dos vitoriosos. Essa mudança
está expondo de uma maneira surpreendentemente rápida seu viés político. E
exigirá do futuro Ministro da Justiça Sérgio Moro habilidades políticas que,
aparentemente, ele não dispõe.
Nem se fale do
caso do motorista de Flávio Bolsonaro. Os palpiteiros gerais da nação, Deltan Dallagnol
e colegas, não ousaram ir além de comentários genéricos. O procurador que
montou um power point em cima de provas indiciárias, e se tornou dono de uma
verborragia incontrolável, sobre o caso do motorista lmitou-se a um sintético
“Bem lembrado”, ao comentário de uma colega, sobre as razões do motorista não
ter sido submetido a uma condução coercitiva.
Nos
primeiros dias após ter aceito o convite, Moro garantiu que funcionaria como um
filtro dos escândalos do governo Bolsonaro. Escândalos não embasado seriam
relevados, escândalos de peso seriam considerados.
O
caso do novo Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles será seu terceiro
desafio.
No
primeiro, o caixa 2 de Onyx Lorenzoni, demonstrou uma enorme incapacidade de
construir sofismas verossímeis, sugerindo que estava absolvido por ter
demonstrado arrependimento.
No
segundo, o caso do motorista, o silêncio foi constrangedor.
O
terceiro será mais desafiador: encarar as acusações contra o futuro Ministro do
Meio Ambiente, Ricardo Salles. Enquanto Secretário do Meio Ambiente de São
Paulo, Salles modificou mapas elaborados pela Universidade de São Paulo,
alterou a minuta do plano de manejo e é acusado de ter perseguido funcionários
da Fundação Florestal que se recusaram a participar da jogada, que beneficiava
mineradoras em áreas de manejo florestal. Como fica?
Mas
o desafio final serão as revelações sobre a vida pregressa política de Jair, um
frequentador histórico das práticas políticas do baixo clero.
Se
o motorista do filho já produziu esse estrago, o que não ocorreria com a
revelação das práticas de Jair?
Os militares
De certo modo,
a eleição de Bolsonaro não é o início de um novo tempo, mas o capítulo final da
desmoralização do poder civil e das instituições democráticas. Afinal, para os
inimigos da democracia, é o exemplo mais acabado da irracionalidade do processo
eleitoral.
Na
montagem do governo, os militares montaram o eixo mais racional, impedindo a
ação dos lobbies no Ministério das Minas e Energia e em outros postos chave.
Além de monitorarem as impropriedades de Bolsonaro, providenciando correção
rápida das declarações absurdas, que poderiam ter implicações nas relações
externas.
Á
medida em que se sucedam as impropriedades da banda fundamentalista, o eixo
militar irá ampliando sua atuação. Já há notícias de que reivindicam o comando
da Infraero e outras estatais chaves.
Retomando
nosso fio inicial, sobre a repetição de padrões históricos, a experiência de
1964 foi uma repetição a dos tenentes em 1930 e será repetida em 2019.
Os
primeiros militares ascendem aos postos com o sentido de missão. À medida em
que seu poder vai se estendendo, haverá um movimento similar na iniciativa
privada, de contratação de militares da reserva bem relacionados com os que
estão no governo. Retornarão os convites sociais aos comandantes militares,
serão retomadas as visitas aos quarteis.
Tudo
isso resultará em um ganho de status social e econômico que, mais à frente,
será o maior fator de resistência para os militares se recolherem novamente aos
quarteis e clubes militares.
Com
a ascensão do poder militar, o projeto da direita ganhará racionalidade. Mas, a
julgar pelo mais influente dos militares no governo, o general Augusto Heleno,
não se abandonará o discurso do perigo vermelho e dos inimigos da pátria.
Enfim, não parecem ter cabeça para um projeto unificador do país.
O livro de
Madeleine Fullbright traz um bom retrato do que virou o fascismo na Itália,
depois que Mussolini caiu em desgraça.
As
notícias da partida de Mussolini foram o estopim para celebrações Itália afora.
Milhares de fotos emolduradas do ditador deposto foram retiradas de paredes e
jogadas no lixo; de uma hora para outra, um fascista assumido virara a criatura
mais rara de se encontrar.
Aqui
no Brasil, assim que cair o mito Bolsonaro, os neo-direitistas se recolherão e
voltarão a fazer profissão de fé, ou no poder militar, ou na democracia,
dependendo apenas do vento do momento.
Na
época de Hitler, Charles Chaplin produziu e protagonizou um filme célebre, “O
grande ditador”, no qual um inofensivo barbeiro é confundido com o ditador.
O
discurso final ajudou a acalentar a humanidade nas décadas seguintes, em que o
mundo redescobriu a colaboração e tentou se civilizar:
Em
vez da torrente de impropérios esperada pela plateia , Chaplin profere uma
homilia sobre a resiliência do espírito humano perante o mal . Pede aos
soldados que não se entreguem a “ homens que os desprezam , escravizam . . .
tratam a vocês como gado e os usam como bucha de canhão . . . homens
antinaturais – homens mecânicos com mentes e corações mecânicos . Vocês não são
máquinas ! Vocês não são gado ! Vocês são homens ! Têm o amor da humanidade em
seus corações . ” “ Neste momento minha voz atinge milhões de pessoas mundo
afora ” , diz à plateia o humilde barbeiro . “ Milhões de homens , mulheres e
crianças desesperados – vítimas de um sistema que leva homens a torturar e
aprisionar gente inocente . Aos que podem me ouvir , digo : não se desesperem .
. . O ódio dos homens vai passar , os ditadores perecerão e o poder que tomaram
do povo retornará ao povo . . . A liberdade nunca perecerá . ”
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