Leonardo
Boff, no Jornal do Brasil
Tempos atrás publiquei
um artigo com o título Contra as tramoias da direita: sustentar a Dilma
Rousseff. Agora, em tempos de campanha presidencial, vejo como ele
mantém ainda atualidade. Refaço o texto no contexto atual. É notório que a
direita brasileira, especialmente aquela articulação de forças elitistas
que sempre ocuparam o poder de Estado e o trataram como propriedade privada
(patrimonialismo), apoiadas pela mídia privada e familiar, está se aproveitando
da crise que é mundial e não apenas nacional (e temos a vantagem de manter um
mínimo de crescimento e o emprego dos trabalhadores, coisa que não acontece nem
na Europa nem nos EUA) para fazer sangrar a presidenta Dilma e desmoralizar o
PT, e assim criar uma atmosfera que lhes permite voltar ao lugar que por via
democrática perderam.
Celso Furtado num livro
pouco lido A construção interrompida (1993) escreveu com
acerto: ”O tempo histórico se acelera, e a contagem desse tempo se faz
contra nós. Trata-se de saber se temos um futuro como nação que conta na
construção do devenir humano. Ou se prevalecerão as forças que se empenham em
interromper o nosso processo histórico de formação de um Estado-nação”
(Paz e Terra, Rio, 1993, 35).
Aqui reside a verdadeira
questão: queremos prolongar a dependência daquelas forças nacionais e mundiais
que sempre nos mantiverem alinhados e sócios menores de seu projeto,
ou queremos completar a invenção do Brasil como nação soberana que tem muito
que contribuir para a atual crise ecológico social do mundo.
Se por um lado não
podemos nos privar de algumas críticas ao governo do PT, mas críticas
construtivas, por outro, seria faltar à verdade se não reconhecêssemos os
avanços significativos sob os governos do Partido dos Trabalhadores. A inclusão
social realizada e as políticas sociais benéficas para aqueles
milhões que sempre estiveram à margem possuem uma magnitude histórica cujo
significado ainda não acabamos de avaliar, especialmente se nos confrontarmos
com as fases históricas anteriores, hegemonizadas pelas elites tradicionais que
sempre detiveram o poder de Estado.
Surgiu um estranho ódio
contra o PT em muitos âmbitos da sociedade: suspeito que esse ódio é
porque as políticas públicas permitiram aos pobres usarem o avião e visitarem
seus parentes no Nordeste, que conseguiram comprar seu carrinho e comprar num
shopping moderno. O lugar deles não é no avião mas permanecer lá na periferia,
pois esse é seu lugar. Mas eles foram integrados na sociedade e em seus
benefícios.
Devemos aproveitar
as oportunidades que os países centrais em profunda crise nos propiciam:
reafirmar nossa autonomia e garantindo nosso futuro autônomo mas relacionado
com a totalidade do mundo ou desperdiçá-las, e viveremos atrelados ao destino
sempre decidido por eles que nos querem condenar a sermos apenas os
fornecedores dos produtos in natura que lhes falta e assim
voltam a nos recolonizar.
Não podemos aceitar esta
estranha divisão internacional do trabalho. Temos que retomar o sonho de alguns
de nossos melhores analistas do quilate de Darcy Ribeiro e de Celso
Furtado entre outros que propuseram uma reinvenção ou refundação do Brasil sobre
bases nossas, gestadas pelo nosso ensaio civilizatório tão enaltecido
mundialmente.
Este é o desafio lançado
aos candidatos à mais alta instância de poder no país. Não vejo figura melhor
para seguir nesta reconstrução a partir de baixo, com uma democracia
participativa, com os seus conselhos e movimentos populares opinando e
ajudando a formular caminhos que nos levem para frente e para o alto do que a
atual presidenta Dilma.
A situação é urgente,
pois, como advertia pesaroso Celso Furtado: “Tudo aponta para a inviabilização
do país como projeto nacional” (op.cit. 35). Nós não queremos aceitar como
fatal esta severa advertência. Não devemos reconhecer as derrotas sem
antes dar as batalhas como nos ensinava Dom Quixote em sua gaia
sabedoria.
Essa batalha será
decidida dia 5 de outubro. Que os bons espíritos guiem os rumos de nosso país.
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