Umas escritas
Sírio
Possenti, Ciência Hoje
Grafias incorretas
podem significar o esforço de pessoas menos escolarizadas para escrever
adequadamente. Muitas vezes, revelam hipóteses sobre como lidar com casos em
que a relação entre fala e escrita é menos transparente, como mostra Sírio
Possenti em sua coluna.
O português popular escrito, de Edith Pimentel Pinto (São Paulo: Contexto, 1990), é um volume
precioso. Deveria fazer parte da bibliografia dos cursos de letras, pedagogia e
jornalismo, pelo menos.
Estudantes de letras
teriam à disposição uma bela amostra das principais características da escrita,
tanto do ponto de vista textual quanto ortográfico, quando exercida por pessoas
não muito escolarizadas. Ao invés de apenas fazer rir (como ocorre com as
numerosas ‘placas do meu Brasil’, que podem ser vistas na internet), o livro é
um precioso documento de indícios das hipóteses que vão pela cabeça das pessoas
quando decidem escrever. Escrever é sempre um pouco solene, e, portanto, nunca
se trata de descuido – como muitos poderiam pensar.
Pedagogos teriam nele
um mapa das dificuldades pelas quais passa uma criança que aprende a escrever,
todas pertinentes, algumas variando de região a região e de classe social a
classe social, mas muitas comuns a todas.
Jornalistas, cuja
ferramenta é a língua, poderiam aprender a tratar a variação como um fato (que
até poderia ser notícia), sem contar que lá estão muitos ‘erros’ que eles
mesmos cometem depois de 15 anos de escola e em uma profissão na qual se
escreve diariamente...
Quando
se encontram grafias como ‘curuja’ ou ‘minino’, a pronúncia dessas vogais e
nessas posições explica o fato. É um erro de escrita, evidentemente, mas tem
explicação. E está longe da burrice. O mesmo vale para ‘maudade’ (sem contar
que a dúvida entre ‘mal’ e ‘mau’ pode continuar pela vida afora).
Esses erros revelam
aspectos da língua falada e hipóteses sobre como lidar com casos em que a
relação entre fala e escrita é menos transparente (ninguém erra ‘baba’ ou
‘data’).
No entanto, há escritas
efetivamente erradas, mesmo que se trate de fatos cuja natureza tem a ver com
os acima mencionados, e cuja função é derrisória. São erros produzidos
conscientemente, para humilhar. Ocorrem na escrita de gente estudada, que
circula pela mídia, e que se vale de certo traço da linguagem de determinados grupos
sociais para sugerir que se trata de gente despreparada, inferior, que deveria
ficar no seu lugar. Leia mais: http://migre.me/wz1aY
.
Leia mais sobre temas da atualidade:
http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário