Vendeta, seu nome é
Mandetta, o Ministro que acabou com o Mais Médicos
O racional Mandetta, o homem que coloca a objetividade e o compromisso
com a saúde acima das disputas ideológicas, explica porque promoveu o maior
desastre sanitária pré-pandemia, o fim do programa Mais Médicos.
Luis Nassif, Jornal GGN
O livro do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique
Mandetta é um testemunho precioso desses tempos de loucura. Expõe o hospício bolsonariana de dentro,
o Ministro da Educação disputando o título de mais radical, o da Economia sem conseguir de sair da frente do espelho, espelho meu, a familia Bolsonaro tresloucada, submetendo o futuro do país às suas pirações tenebrosas e ministros militares submissos a um presidente sem noção.
É um livro de defesa, com pouco espaço para a auto-crítica.
Por exemplo, o racional Mandetta, o homem que
coloca a objetividade e o compromisso com a saúde acima das disputas
ideológicas, explica porque promoveu o maior desastre sanitária
pré-pandemia, o fim do programa Mais Médicos. Porque jamais conseguiria
admitir o comércio de pessoas, de médicos cubanos trabalhando e a maior
parte da renda indo para o governo cubano.
Ideologismo rasteiro da pior qualidade. Primeiro, por não pensar naqueles que estavam sob sua responsabilidade, as populações brasileiras atendidas pelo programa e que foram abandonadas à própria sorte, enquanto Mandetta enchia os ares de fake news sobre os médicos brasileiros que substituiriam os cubanos.
Depois, pela supina ignorância de não conseguir entender um modo de vida diferente do seu,
de um país que trata a saúde pública como bem público e tem como produto de
exportação médicos especializados em saúde pública – a maior parte dos quais com
notável espírito público de combater as doenças em países estrangeiros, sabendo
que parte relevante dos recursos irá para o bem estar de seus cidadãos.
Ou o Ministro que, ao longo do livro, discorre com propriedade sobre os gastos
públicos como fator de bem estar geral, não consegue assimilar esse conceito
fora da sua realidade ruralista?
Em muitos episódios, o personagem que se coloca como o Sir Galahad da saúde tenta
curar a infecção da politiquice com mercúrio cromo. Como no episódio em que
muda os critérios de distribuição das verbas da saúde para atender seu
correligionário Antônio Carlos Magalhaes Neto, prefeito de Salvador.
O segundo ponto é a defesa sincera que faz da Fiocruz, a admissão de que a
maior parte dos sanitaristas é de esquerda e o receio sincero de que
Bolsonaro boicotasse o programa por conta de sua visão míope de ideologia.
Foge do tema principal: porque, desde o começo, não acatou as recomendações da
Fiocruz e antecipou a guerra contra o Covid, com o isolamento e a compra
antecipada de respiradores e outros produtos médicos? E porque, sendo
num centrista racional, foi o primeiro do seu partido a apoiar
integralmente Bolsonaro?
Houve o aviso, sim, e Mandetta ignorou solenemente. No livro, atribuir a
responsabilidade à Organização Mundial da Saúde e humildemente conta que foi
ele quem alertou a instituição para a dimensão da pandemia que vinha pela frente.
De qualquer modo, assim como o General Della Rovere, no filme clássico de Victorio De Sicca, de Crápula a Herói, em determinado momento Mandetta
deu-se conta de que as circunstâncias lhe tinham conferido um papel histórico.
E comportou-se com dignidade à altura do personagem que passou a personificar.
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