16 julho 2021

Identidade urbana

Em defesa dos centros históricos

Cida Pedrosa*

 

A construção da identidade de uma cidade e de suas memórias afetivas parte do centro. Mas os espaços históricos das cidades brasileiras já enfrentam, há décadas, um processo de esvaziamento e decadência. No Recife, esse processo acentuou-se a partir da década de 1970, com comércio e serviços sendo transferidos para bairros de classe média alta como Boa Viagem, Espinheiro e Casa Forte, e agravou-se com o surgimento dos shoppings. 

Esses centros de compras juntaram tudo em um só lugar, oferecendo comodidades como ar-condicionado e amplo estacionamento para uma classe média cada vez mais motorizada e ávida por segurança. Ruas que antes eram vitrines, como a Nova e a Imperatriz, deixaram de ser atraentes para esse público. Até mesmo serviços públicos buscaram novos endereços. Um exemplo é o INSS, que deixou o Edifício Segadas Viana, na Rua Marquês do Recife. O prédio de dez andares está abandonado desde 2005 e recentemente foi ocupado por famílias sem teto.

O que já estava ruim, agravou-se com a pandemia, responsável pelo fechamento de muitas lojas nos bairros de São José, Santo Antônio e Boa Vista. Só o comércio ambulante parece manter o vigor numa área que abriga cada vez menos moradores e acumula muitos imóveis subutilizados, em contraste com o grande déficit de moradias da cidade.

Mas é possível construir novas possibilidades de vivência nessa área que concentra muito do patrimônio histórico da cidade, ainda com grande potencial turístico, e que já foi um polo de efervescência cultural e de comunicação.

Precisamos incentivar projetos que promovam a moradia no centro do Recife, principalmente para as classes menos abastadas, mas também para a classe média que a cada dia deseja morar mais perto de onde trabalha. No século 17, já havia prédios de uso misto nessa área, com comércio nos pavimentos térreos e unidades residenciais nos andares de cima, e esse é um projeto que pode ser retomado. Morar num centro revitalizado pode significar economia com transporte na maioria dos deslocamentos, o que barateia o custo de vida, além de resultar numa nova dinâmica para essas localidades. Isso não é exclusividade do Recife: está na pauta de muitas capitais brasileiras.

O centro pode renascer se houver incentivo a novos arranjos culturais e possibilidades econômicas. Pensando nisso, nosso mandato encabeça a constituição da Frente Parlamentar pelo Centro do Recife, recentemente aprovada em reunião plenária.

Nosso intuito, entre outras coisas, é formular, incentivar, implementar, acompanhar e fiscalizar políticas públicas voltadas para o território central e incentivar a implementação de ações previstas no Plano Municipal de Preservação das Áreas Históricas. A cidade “metade roubada ao mar, metade à imaginação”, como definia o poeta Carlos Pena Filho, precisa ser reinventada e revivida para preservar seu maior patrimônio: a história de seu povo.

* Advogada, poeta, vereadora do Recife (PCdoB)

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