Em marcha para a
recolonização
Marcio Pochmann, Blog do Renato
Os 200 anos que se sucederam à declaração da
Independência nacional, em 1822, podem ser divididos em quatro distintos
períodos de tempo: mercantilismo, liberalismo, desenvolvimentismo e
neoliberalismo. O primeiro, referente ao Império, prevaleceu por 67 anos
assentado no trabalho escravo sob a dominância do Estado absolutista a
sustentar a família real, a nobreza e o clero.
A
primeira República ou República Velha que durou 41 anos, constituiu o segundo
período estruturado em torno do Estado mínimo liberal a fomentar o capitalismo
nascente condicionado pelos interesses da oligarquia agrarista
primário-exportador. Da Revolução de 1930 à transição democrática da metade dos
anos de 1980, o terceiro período, que correspondeu ao avanço do capitalismo
urbano e industrial conduzido pelo Estado desenvolvimentista e fomentador da
burguesia, da classe média assalariada e do operariado manufatureiro.
O quarto período trata do final da década
de 1980 aos dias de hoje. Pela hegemonia neoliberal, o sistema produtivo
complexo, diversificado e integrado associado à substituição de importações foi
sucedido pelo modelo econômico atual de especialização rentista e
primário-exportador.
Em simples comparação temporal, os quatro
distintos períodos podem ser hierarquizados segundo indicadores econômicos
selecionados. Ao se considerar o comportamento do Produto Interno Bruto (PIB)
per capita, nota-se que o período atual (neoliberal) apresenta o pior
desempenho econômico de todo o regime republicano (desde 1889).
Nas últimas quatro décadas, por exemplo,
o PIB per capita cresceu a uma média de 0,6% ao ano, enquanto no período
desenvolvimentista, entre as décadas de 1930 e 1970, a renda nacional dividida
por habitantes, aumentou 3,3% como média anual. Na República Velha (1889-1930),
o PIB per capita cresceu, em média, 0,7% ao ano.
Percebe-se, portanto, que o período atual
somente consegue superar o do Império, cuja expansão média anual do PIB per
capita foi de apenas 0,3% ao ano. Para maiores detalhes, ver o livro
recém-lançado: “O neocolonialismo à espreita: mudanças estruturais na sociedade
brasileira“.
A razão da prevalência do desempenho da
renda nacional per capita muito desfavorável a partir de 1980 se deve
fundamentalmente à perda do vigor econômico nacional. Isso porque o crescimento
médio anual da população brasileira foi o menor de todos os tempos.
Entre 1980 e 2020, por exemplo, a
expansão média anual da população nacional foi de somente 1,4%, ao passo que
durante o Império foi de 1,7%. No liberalismo, entre os anos de 1889 e 1930, a
população brasileira cresceu 2,2% ao ano, enquanto no período
desenvolvimentista, entre os anos de 1930 e 1980, o número de brasileiros
aumentou 2,6%, a maior expansão média anual dos últimos 200 anos.
Do ponto de vista econômico, o
esvaziamento da vitalidade nacional se encontra associado à forma com que o
país ingressou na globalização a partir de 1990. Passiva e subordinadamente, o
Brasil internalizou a fórmula balsâmica das altas taxas de juros combinada com
a valorização cambial, acreditando que o problema do atraso nacional se devia
ao Estado desenvolvimentista.
A primazia da condução neoliberal desde
então se procedeu como se fosse uma espécie de segunda abertura dos portos “às
nações amigas”. Na primeira abertura dos portos conduzida por D. João VI, em
1808, assistiu-se ao ingresso na Era Industrial pela condição de comprador de
bens e serviços industriais subordinada ao modelo econômico agrarista
primário-exportador.
Isso somente foi rompido pela Revolução
de 1930, quando o Brasil se afirmou na Era Industrial como um país que se
transformou de importador em exportador de bens e serviços industriais, alguns
anos depois. Para isso, o liberalismo deu lugar ao desenvolvimentismo, próprio
da desglobalização registrada entre as décadas de 1910 e 1970.
Na segunda “abertura dos portos”, o
Brasil ingressou na atualidade da Era Digital enquanto grande país consumidor.
Ao deixar de produzir internamente os bens e serviços digitais, o país passou a
perseguir, novamente, o modelo primário-exportador, com o agravante de ter se
convertido em plataforma de financeirização do estoque de riqueza velha.
Ou seja, o Brasil passou a repetir,
guardada a devida proporção, a crescente dependência das receitas advindas das
exportações de produtos primários e semiprocessados (especialização produtiva)
para financiar importações de bens e serviços digitais. Com isso, o dinamismo
econômico interno foi muito enfraquecido pelo abandono do sistema produtivo
complexo, diversificado e integrado, o que explicita o desastre econômico do
período neoliberal atual.
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Veja: Federação para
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e derrotar Bolsonaro https://bit.ly/3uGYIiS
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