20 abril 2010

O Bric e a delicada transição para uma nova ordem mundial

Editorial do Vermelho:


O Brasil foi palco de dois importantes encontros no final desta semana. Dirigentes do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) e do IBAS (Índia, Brasil e África do Sul), estiveram reunidos em Brasília para reforçar os laços econômicos e políticos que unem estes países e debater iniciativas e caminhos na direção de uma nova ordem mundial.

Como destacou o presidente do Partido Comunista do Brasil, Renato Rabelo, durante reunião da Comissão Política do PCdoB sexta-feira (16), foram celebrados relevantes acordos e parcerias entre os membros dos dois grupos. O acontecimento revela “a nova fase da geopolítica mundial”, ponderou o dirigente comunista.

Não restam dúvidas de que o mundo ingressou numa delicada fase de transição, que decorre objetivamente das alterações na correlação de forças no plano da economia política, promovidas pelo desenvolvimento desigual das nações. Tal movimento tem sido respaldado pela mudança do cenário político que se verifica na América Latina e em outras regiões do planeta.

A atual ordem mundial, liderada pelo capitalismo americano, caducou. Ela foi uma herança do pós-guerra, que refletiu o equilíbrio de poder da época, caracterizado pela sufocante hegemonia dos EUA no mundo capitalista, com o contraponto do “socialismo real” que orbitava em torno da União Soviética, originando a bipolaridade da guerra fria.

Com o colapso do socialismo no leste europeu, cujo marco foi a queda do Muro de Berlim em 1989, o império americano despontou como única força relevante na geopolítica internacional. Sobreveio o mais radical unilateralismo, o “Consenso de Washington”, as guerras preventivas, declaradas a despeito da oposição do Conselho de Segurança da ONU, chantagens, ameaças e imposições de toda ordem contra as nações consideradas subdesenvolvidas ou em vias de desenvolvimento.

Iludido com a inebriante vitória na “guerra fria”, Tio Sam calculou que poderia moldar uma “nova ordem mundial”, como preconizou George Bush (pai), ajustada à sua imagem, ideologia e interesses. Mas a marcha objetiva da economia já não estava em harmonia com as ambições políticas do império.

Corrompida pelo parasitismo social e a cada dia mais dependente de trabalho e capital alheios para manter um estilo de vida perdulário e insustentável, a economia americana apresentava notórios sintomas de decadência, que se agravaram ao longo dos anos. O tema foi objeto de intensa polêmica na ocasião e aqueles que enxergaram e denunciaram a trajetória declinante foram taxados de catastrofistas pelos apologistas do império. O tempo mostrou quem tem razão.

Os Estados Unidos perderam terreno na ingrata corrida do desenvolvimento desigual, ao mesmo tempo em que a comunidade mundial assistia, com surpresa e admiração, à vertiginosa ascensão do chamado “socialismo de mercado” chinês.

Ao lado da China e estimulados por seu extraordinário crescimento, emergiram outras economias de peso no cenário internacional e aqui cabe destacar as nações que compõem o BRIC e o IBAS. A crise econômica mundial realçou a decadência americana e acelerou o processo de desenvolvimento desigual e deslocamento do poder do Ocidente para o Oriente. A recuperação da economia mundial já não depende nem pode depender das potências ocidentais. O BRIC respondeu por mais de 50% do crescimento global nos últimos anos.

É deste processo de desenvolvimento (desigual) das nações que emana objetivamente a necessidade de uma transição para uma nova ordem geopolítica, que forçosamente terá de corresponder ao novo equilíbrio de forças. Embora mantenham uma forte supremacia na esfera militar, os EUA já não reúnem condições econômicas, políticas e morais de dar ordens e impor sua vontade ao resto do mundo. As iniciativas do governo Bush neste sentido deram com os burros n´água.

BRIC e IBAS colocaram o dedo nesta ferida e abriram uma agenda carregada de temas como um novo sistema monetário internacional, com a substituição do padrão dólar no comércio exterior, o direito das nações ao desenvolvimento da tecnologia nuclear, a reforma da ONU, do FMI e do Banco Mundial, entre outros.

Não é demais alertar que a transição não está dada, não será pacífica e tampouco se realizará em curto prazo, pois nosso vizinho, ao Norte, não pretende abrir mão da hegemonia e, apesar do assombroso déficit fiscal, continua investindo pesado na ampliação do poderio militar para preservar posições. A nova ordem será um parto da história, não se sabe se com ou sem cesariana, no qual o Brasil pode desempenhar, e em certa medida já está desempenhando, um grande papel.

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