20 janeiro 2015

Ciclo vicioso estéril

Rotina e mesmice em nosso futebol
Luciano Siqueira, no Blog da Folha

O bom senso recomenda não se meter em assunto que a gente não domina, ou apenas enxerga sob o viés da emoção. É o meu caso com o futebol - uma velha relação de amor, mantida quase platônica por haver deixado há muito de frequentar estádios, porém forte sempre, sem que a chama jamais se apague. 

Sim, amigos, vejo tudo pela TV. E sobre o que acontece cá na província, divirto-me escutando as resenhas nas rádios. Só isso.

Mas, como dizem que todo mundo tem um pouco de médico, economista e técnico de futebol, arrisco minha opinião. Ou, no caso, a minha insatisfação.

O que mais me incomoda é a "comemoração" instalada na mídia pelo "êxito" (sic) alcançado pelos três principais clubes pernambucanos na contratação de reforços para a temporada. O Sport não precisou de tanto, por já ter um time previamente montado. Náutico e Santa Cruz, pelo que ouvi ontem, beiram a quase duas dezenas de contratados! Isto com que dinheiro só Deus sabe, tamanha a crise financeira que ambos atravessam há algum tempo. Pior, entre os contratados alguns nomes em final de carreira que, com todo respeito aos veteranos, pouco podem acrescentar em termos de criatividade e resultado.

Certa vez, no intervalo de um programa de entrevistas na TV, perguntei a um dirigente do Náutico por que não se reedita hoje a fórmula que tanto deu resultado no passado, na áurea época do hexa-campeonato, quando se formaram times poderosos a partir da chamada prata da casa e de atletas iniciantes descobertos na região. A resposta foi precisa: "A torcida e os patrocinadores esperam resultados imediatos." 


Ou seja, em nome de um imediatismo burro, rubro negros, alvirrubros e tricolores quedam-se aprisionados no círculo vicioso por eles criado. E gastam verdadeiras fortunas, para os padrões locais, trazendo gente sobretudo do interior de São Paulo e do Rio Grande do Sul, de qualidade duvidosa, quando não alguns ex-craques em declínio, a título de conferir experiência ao elenco.

Dentro das quatro linhas não se vê resultados efetivos. Ou vemos algum, é o que me parece, quando por contingências extraordinárias, tipo contusão de titulares e dos seus reservas imediatos, enfim abrem-se janelas para o aproveitamento de atletas da casa, que despontam nas divisões de base.

Se essa fórmula vem dando errado há tanto tempo, por que não mudar? Essa pergunta, desisti de fazer a quem entende (os que já estiveram com a mão na massa em nossos clubes principais) porque invariavelmente sou brindado com um sorriso enigmático - ou não tanto, suponho, por sugerir a existência de interesses outros, muito distantes da paixão das arquibancadas, que determinam a persistência do erro. 


Assim, numa roda de gente experiente no assunto, provoquei risadas ao sugerir um pacto em favor da racionalidade e da reinvenção do nosso futebol: Sport, Santa Cruz e Náutico trabalhariam por três anos consecutivos a construção de bons elencos a partir de jovens atletas formados em suas fileiras ou captados no interior e na região, até que voltássemos a ter musculatura para disputar com menos vexame e mais sucesso o campeonato brasileiro da série A. Fiquei com cara de herege em pena basílica em missa solene!

E se assim tem que ser, o jeito é me recolher à condição de torcedor bissexto, televisivo e omisso. Até que um dia as coisas mudem. 

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