A crise institucional chegou, ineludível
Por Tereza Cruvinel*, no Brasil 247 – reproduzido no portal Vermelho
Apesar do “fato superveniente” alegado pelo ministro do STF Marco
Aurelio Melo para afastar monocraticamente Renan Calheiros da presidência do
Senado (o fato de ele ter se tornado réu), a coincidência com a votação que o
Senado faria amanhã[7), do projeto que tipifica crimes de abuso de autoridade
por juízes, promotores e procuradores, confere à liminar a sombra de uma
intervenção do Judiciário no Legislativo para evitar uma votação que
contrariava a magistratura. Esta é a leitura que fica.
Mesmo tendo reunido maioria de votos, em 3 de novembro, a favor do
entendimento de que réus não podem ocupar cargos na linha sucessória da
Presidência da República, o julgamento não estava concluído, por força do
pedido de vistas do ministro Toffoli. Apegando-se à maioria, não esperando pela
conclusão formal do julgamento, o ministro Marco Aurélio reforçou a ideia,
ainda que derivada da coincidência, de que sua liminar foi uma retaliação a
Renan por peitar o Judiciário e o Ministério Público, mantendo o projeto em
pauta. Renan pode ter tido, como muitos suspeitam, a sagacidade de escrever a
narrativa de sua própria queda ao insistir no projeto. Para todos os efeitos,
caiu porque peitou o Judiciário, que com sua “urgência” em mostrar força,
permitiu a narrativa. Agora o STF se apressa marcando o exame da liminar para
quarta-feira. Até lá, a nota de Renan indica, ele não vai se render. Não
recebeu a notificação, não declarou que aceita pacificamente a decisão, que
declarou ser contra o Senado. Logo, contra o Legislativo.
Outra sombra grave paira sobre a liminar: a de que foi concedida não
para atender à Rede e a qualquer urgência mas para contentar os que saíram às
ruas no domingo pedindo a cabeça de Renan. Mas cabe ao STF zelar pela
Constituição, não atender ao clamor externo. Milhares foram às ruas mas o país
tem 200 milhões de habitantes. O dia começou com a própria presidente do STF,
Carmem Lucia, sugerindo a necessidade do ativismo político do Judiciário, ao
dizer: “É preciso estarmos atentos ao que o Brasil espera de nós e o que fazer
para atender a essas demandas. Qualquer servidor público atua para atender à
população. Julgamos conflitos na sociedade e vivemos um momento particularmente
grave”. Com toda vênia, como dizem eles no STF, não é papel do Judiciário
“atender demandas” e sim ministrar a justiça.
Pode ter havido uma fatal coincidência entre o ingresso da Rede com ação
no STF pedindo a destituição de Renan e os preparativos no Senado para a
votação do projeto sobre abuso de autoridade. Mas até por isso, para não ser
interpretada como retaliação, a liminar contra Renan podia não ter sido concedida
hoje.
Renan resistiu ao apelo da ministra Carmem Lúcia, que lhe foi
apresentado através de Michel Temer, para que adiasse a votação do projeto
sobre abuso de autoridade. O recado dizia que isso poderia gerar uma grave
crise entre os Poderes, com consequências imprevisíveis. Renan, entretanto,
manteve o projeto na agenda.
Escolhido como relator por Renan e o conjunto de líderes, o senador
Roberto Requião preparou um relatório equilibrado, em que acolheu parcialmente
ponderações do juiz Sergio Moro. Protocolou-o no Senado e postou-o em sua
página eletrônica na tarde desta segunda-feira.
Enquanto isso, pressentindo que as placas tectônicas se moviam na área
do Judiciário, anunciando um tremor de terra, o governo entrou em campo e
chamou uma reunião no gabinete do Ministro da Justiça, onde um texto
alternativo estava sendo discutido com líderes e procuradores, quando veio a
decisão do ministro Marco Aurélio. A ideia era atenuar o projeto de Requião,
especialmente no ponto que fala das investigações prolongadas, que nunca
acabam, em prejuizo do investigado ou fiscalizado.
Não deve haver votação alguma nesta terça-feira de ressaca no Senado. A
noite prometia encontrar-se com o dia na residência oficial do Senado, onde
meio mundo governista estava reunido com o Renan. Sendo a liminar confirmada na
quarta-feira, como deve ser, Renan será substituído na presidência do Senado
pelo petista Jorge Viana, que não é um incendiário, muito pelo contrário. É
equilibrado e dialoga com todo mundo na Casa. Mas também não pilotará nenhum
trator para garantir a aprovação da PEC 55 na semana que vem. Muito menos,
facilitará a aprovação da tenebrosa reforma previdenciária que Temer prometeu
enviar ao Congresso esta semana. Nem creio que proceda a notícia de que Viana
esteja propondo nova eleição para a presidência do Senado. Constitucionalmente
e regimentalmente, cabe a ele concluir o mandato de Renan. Temer pode não
engolir, como dizem seus aliados, um petista na presidência do Senado mas
contra o regimento, pouco pode fazer. Com a mudança no comando do Senado, tudo
muda de figura para Temer e sua agenda. A pinguela de seu governo começa a
balançar sensivelmente.
*Jornalista política. Colunista do Brasil 247.
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