O discurso
econômico antipovo nas eleições
Pedro Rossi,
portal da Fundação Maurício Grabois
Desconfie
de frases feitas como “O Estado não cabe no PIB” e “o Brasil deve escolher
entre crescer ou distribuir”. Quando se diz “o brasileiro não aguenta mais
impostos”, de qual brasileiro estamos falando? Aqui os 10% mais pobres gastam
50% de sua renda com tributos e os 10% mais ricos 23%. Uniformizar o problema é
dizer que não teremos justiça tributária. Na foto, Guedes, o "Posto
Ipiranga" do Bolsonaro, um dos economistas antipovo.
Nessa eleição tenha cuidado com o Pensamento
Econômico AntiPovo (PEAP), ele pode estar na cabeça do seu candidato. O PEAP
nunca se assume como tal, aparenta não ter ideologia, aparece travestido de
técnico, dissimulado em argumentos de autoridade que, tantas vezes repetido,
parecem ser verdades contundentes.
Uma pérola do PEAP é afirmação de que
“Estado não cabe no PIB” que tem variantes como “a Constituição de 1988 não
cabe no Orçamento” ou ainda, como aparece no manifesto do Clube Militar do
General Mourão, a “Extensão dos direitos sociais foi fator desestabilizador”.
Essas afirmações são demofóbicas e incoerentes; o tamanho do Estado não é
problema técnico, mas político. A parcela do PIB que cabe ao Estado é uma
decisão da sociedade sobre os serviços públicos que se pretende financiar coletivamente.
E, como mostra o livro recém-lançado “Economia para Poucos”, reduzir o gasto
social no Brasil implica aumento da desigualdade, já que é a população pobre
que usa mais os serviços públicos e recebe mais transferências.
Enquanto isso, no programa de
Bolsonaro é o mercado, e não o governo, que deve promover inclusão
social. E o foco na educação básica como o elemento promotor da igualdade
de oportunidades soa muito humanitário, mas esconde a desconstrução de outras
atuações públicas fundamentais. Não haverá meritocracia em uma sociedade onde
um jovem de classe média tem tempo livre, acesso à saúde, à cultura, a lazer
etc., enquanto um jovem pobre deve trabalhar depois da escola para complementar
a renda familiar. Isso não se resolve só com gasto em educação, mas com
transferências de renda para as famílias, gastos com saúde, cultura etc.
Pérsio Arida, economista do Geraldo
Alckmin, tem afirmado que “não é função do governo gerar empregos”, tese
amplamente compartilhada por candidatos e economistas midiáticos. Enquanto o
desemprego se desdobra em inúmeras mazelas sociais, a turma do PEAP advoga por
políticas para as empresas privadas para “melhorar o ambiente de negócios” e
“recuperar a confiança” para ver se, a posteriori, o mercado se encarrega
dos desempregados.
Quando o candidato diz que “o brasileiro
não aguenta mais impostos” todos gostam de ouvir. Mas de qual brasileiro
estamos falando? Vivemos em um país onde os 10% mais pobres comprometem em
torno de 50% de sua renda com tributos e os 10% mais ricos contribuem com
apenas 23%. Uniformizar o problema é dizer nas entrelinhas que não teremos
justiça tributária no Brasil.
Outra pérola do PEAP é a afirmação de que
“o Brasil deve escolher entre crescer ou distribuir” como se houvesse um
dilema entre o tamanho do Estado e o crescimento e que cortar gastos fosse
pré-condição para crescer. É a reedição da velha “ladainha do bolo” que se
espera crescer para depois distribuir. Nada mais falso. Os dois volumes do
livro “Growing Public” de Peter Lindert estão repletos de evidências
estatísticas que mostram que o crescimento do gasto social não leva a queda no
PIB, pelo contrário, pode incentivar o crescimento.
“Não há alternativa”, diz a
pérola clássica do Pensamento Econômico AntiPovo que também expõe todo o
seu viés autoritário que aparece também nos trabalhos do seus gurus como,
aliás, está explícito em pensadores como Hayek, para quem a democracia pode
degenerar em coerção praticada pela maioria (pobre?) sobre a minoria (rica?) e
que é preferível uma ditadura liberal a uma democracia com falta de
liberalismo.
Pedro Rossi é professor do Instituto de Economia da
Unicamp, diretor do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica da
Unicamp e coordenador do Conselho Editorial do Brasil Debate. Artigo publicado
por Brasil Debate em parceria com a Carta Capital
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