Saída de cubanos afeta também os centros urbanos
Wagner de Alcântara Aragão,
CartaCapital
O
desmantelamento do programa deixa sobretudo os rincões desassistidos. Mas
regiões metropolitanas e cidades de médio porte serão muito prejudicadas
Os mais de 8 mil cubanos do Mais Médicoscomeçam a deixar o Brasil
nesta segunda quinzena de novembro, convocados pelo governo de Cuba em resposta à
hostilidade do presidente eleito, Jair Bolsonaro, e seus apoiadores, para com
os profissionais do país irmão.
A partida dos latino-americanos
prejudicará a assistência à saúde em quase 1,5 mil municípios nas cinco regiões
brasileiras. Segundo o Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde,
611 cidades correm o risco de ficar sem nenhuma equipe médica.
Os mais afetados serão os moradores dos
rincões do País – aldeias indígenas, povoados nos sertões nordestinos,
localidades na Amazônia, além de comunidades ribeirinhas e quilombolas, por exemplo. Mas populações
dos grandes centros urbanos também ficarão desassistidas.
De acordo com dados divulgados pelas
autoridades, diversos municípios, regiões metropolitanas e cidades de médio
porte sofrerão um baque considerável com o desmantelamento do Mais Médicos,
programa criado em 2013 pelo governo federal.
Em Guarulhos, maior cidade do estado de
São Paulo depois da capital, mais da metade dos profissionais do Mais Médicos
(28, de um total de 54) é formada por cubanos. Em outros dois grandes centros
paulistas a proporção é semelhante: no ABC, dos 151 médicos do programa
federal, 81 são do país caribenho. Em Campinas, são 46 cubanos de um total de
87 profissionais.
Ainda em São Paulo, na Baixada Santista
a equipe do Mais Médicos será reduzida em 40%, com a partida dos 65 cubanos que
atuam nos municípios daquela região metropolitana (de um total de 163
profissionais).
Só em Santos, cidade do ex-ministro da
Saúde (2012-2014) do governo Dilma Rousseff, o médico e professor Arthur
Chioro, 26 cubanos estão se despedindo da rede básica. “É uma tragédia para a
vida e a saúde de 30 milhões de brasileiros”, escreveu Chioro.
De outros estados, os levantamentos
mostram desfalques igualmente consideráveis. Ponta Grossa, no Paraná, vai
perder 60 dos 80 profissionais do Mais Médicos no município, com a partida dos
cubanos. Em Londrina, dez, de um total de 40 médicos, são cubanos e deixam a
rede de saúde local. Em Joinville, na vizinha Santa Catarina, a redução da
equipe será em torno de 10% (11 cubanos de um total de 111 médicos), percentual
semelhante ao de Porto Alegre – 14 cubanos deixam a capital gaúcha.
Números do programa
De acordo com o Ministério da Saúde, o
Mais Médicos contava atualmente com 8.332 cubanos, dos 18.240 profissionais que
compõem as equipes do programa. São Paulo era o Estado com maior número de
profissionais da ilha caribenha (1.394), seguido da Bahia (822), Rio Grande do
Sul (611) e Minas Gerais (596). Na distribuição por região, o Nordeste
concentrava um terço dos médicos cubanos; o Sudeste 29%, o Sul 15,8%, o Norte
15,7% e o Centro-Oeste 5,5%.
Dos 5.570 municípios existentes no
Brasil, o Mais Médicos está presente em 3.228. Ainda segundo o Ministério da
Saúde, 90% da população indígena é assistida pelo programa.
O Mais Médicos foi criado no governo
Dilma Rousseff em 2013, como resposta às manifestações de junho daquele ano,
que, entre outras pautas, continha reivindicações por melhoras na saúde
pública. Desde o início, as vagas do programa são destinadas prioritariamente a
profissionais brasileiros. As não preenchidas é que são ocupadas por
estrangeiros.
Para substituir os cubanos, o
Ministério da Saúde lançou nesta quarta, dia 21, edital para o preenchimento
das vagas abertas. As inscrições ficam abertas até dia 25.
O que diz o governo cubano
Em nota, o Ministério da Saúde Pública
da República de Cuba sustenta a decisão de se retirar do Mais Médicos em razão
das “referências diretas, depreciativas e ameaçadoras à presença de nossos
médicos [no Brasil]” e das declarações de modificações dos termos e condições
da colaboração cubana com o programa brasileiro, “com desrespeito à Organização
Pan-americana da Saúde [Opas] e ao conveniado por ela com Cuba, ao pôr em
dúvida a preparação de nossos médicos e condicionar sua permanência no programa
a revalidação do título e como única via a contratação individual.”
Para o governo cubano, “as mudanças
anunciadas impõem condições inaceitáveis que não cumprem com as garantias
acordadas desde o início do Programa, as quais foram ratificadas no ano 2016
com a renegociação do Termo de Cooperação entre a Organização Pan-americana da
Saúde e o Ministério da Saúde da República de Cuba. Estas condições
inadmissíveis fazem com que seja impossível manter a presença de profissionais
cubanos no Programa (…) Não aceitamos que se ponham em dúvida a dignidade, o
profissionalismo, e o altruísmo dos colaboradores cubanos que, com o apoio de
seus familiares, prestam serviço atualmente em 67 países”.
*Wagner de Alcântara Aragão é
jornalista e professor. Mestre em estudos de linguagens. Licenciado em
geografia. Bacharel em comunicação. Mantém e edita a Rede Macuco
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