O parentesco desastroso para a educação
O parentesco entre Paulo Guedes, ministro da Economia, e Elizabeth
Guedes, vice-presidente da Associação Nacional de Universidades Privadas, é
incrivelmente conveniente para os privatistas do ensino.
Madalena Guasco Peixoto, CartaCapital
“Desoneração da folha de escolas
particulares não reduz mensalidades.” Ou “Faculdades que recebem recursos do
Fies reajustam preços acima da inflação”. Ou ainda “Faculdades privadas tentam
cobrar de aluno reajuste do Fies barrado pelo MEC”.
Esses são os títulos de apenas
três das notícias encontradas numa rápida pesquisa no Portal da Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino — Contee, entidade que
representa mais de 1 milhão de professores e técnicos administrativos que atuam
no setor privado de
ensino em todo o Brasil, busca suficiente para mostrar que o nome de Elizabeth
Guedes, que ganhou os noticiários nas últimas semanas, já nos é um velho
conhecido.
A vice-presidente da Associação
Nacional de Universidades Privadas (Anup) chamou a atenção recentemente por
dois motivos. O primeiro: ser irmã de Paulo Guedes,
o tal “Posto Ipiranga” de Bolsonaro, futuro ministro da Economia e assessor
econômico do PSL durante toda a campanha presidencial e defensor de uma espécie
de privatização ampla, geral e irrestrita.
O segundo: apoiar publicamente a
transferência das universidades, já anunciada por Bolsonaro, da
responsabilidade do Ministério da Educação para o de Ciência e Tecnologia.
Confrontar o posicionamento de
Elizabeth Guedes noticiado agora com as matérias compartilhadas no Portal da
Contee — publicadas, respectivamente, em 2013, 2014 e 2015 — não deixa de ser
interessante, também por duas razões. É claro que se trata de uma análise
superficial, mas que, ainda assim, já evidencia, cronologicamente, o
crescimento de forças relativamente diferentes, mas complementares: de um lado,
a sanha privatista por mais e mais verbas públicas para ampliar seus lucros; de
outro, o papel, no golpe de 2016, dos grandes oligopólios educacionais
representados pela diretora da Anup, como a Kroton Educacional S/A, a
Anhanguera Educacional Participações S/A (incorporada, em 2014, à Kroton) e a Estácio Participações
S/A — empresas que, diga-se de passagem, cresceram
substancialmente durante os governos Lula e Dilma, mas que não hesitaram em se
aliar aos golpistas à medida que o governo passou a não corresponder mais a
seus interesses.
Esse papel ficou claro, por
exemplo, no aparelhamento do Conselho Nacional de
Educação (CNE); no desmonte do Fórum Nacional de
Educação como conquista da sociedade civil organizada e dos
movimentos educacionais — substituindo entidades históricas defensoras do
fortalecimento da educação pública e da regulamentação do ensino privado, como
a própria Contee, por lobistas do capital privado —; na desconstrução e
inviabilização de uma real Conferência Nacional de
Educação (Conae); na influência na aprovação das Bases Nacionais
Comum Curriculares (BNCCs) da educação fundamental e média, a fim de agradar as
fundações e grupos privados que já estão de olho no oferecimento de modelos de
gestão privada para a educação pública, bem como nas plataformas on-line e
material didático.
Afinal, não é à toa que Bolsonaro
defende Educação Fundamental a distância e que no dia 8 de novembro o CNE
aprovou a BNCC do Ensino Médio com a possibilidade de 30 % da carga a
distância.
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O apoio de Elizabeth Guedes à
transferência pretendida por Bolsonaro escancara o que sempre ficou claro em
relação ao grupo que ela representa: o fato de que sequer compreendem o Ensino Superior como
educação e que, por isso, pouco estão preocupados com sua qualidade. Sob, outro
viés, contudo, o interesse alterou-se drasticamente.
Se, há cinco anos, tudo o que as
instituições de ensino superior privadas, sobretudo os oligopólios de capital
aberto, não queriam era dividir o farto bolo oferecido pelo governo, via
desoneração, com as escolas de Ensino Fundamental e Médio, o que a retirada do
Ensino Superior do MEC faz hoje é liberar recursos para a Educação Básica,
setor que esses grandes conglomerados privatistas têm tentado cada vez mais
abocanhar. E esse desejo se torna ainda mais factível — e lucrativo — com as
propostas de Bolsonaro e do outro irmão Guedes de implementar Ensino Básico a
distância e distribuição de vouchers para a educação.
O parentesco, portanto, é
incrivelmente conveniente para os privatistas do
ensino. Paulo Guedes, que nem sabia o orçamento que deve ser aprovado pelo
Congresso, vai ser ministro para servir ao mercado financeiro, para aumentar
seus lucros e, com sua irmã e parceira, para privatizar a educação superior
brasileira e agradar, com ganhos certos, as grandes corporações internacionais
de capital aberto que atuam no Brasil no domínio de instituições públicas e
privadas. Essa é a parceria do fim da educação como direito e como dever do
Estado; parceria do fim dos direitos trabalhistas e previdenciários; parceria
em favor do grande capital especulativo; parceria contra a soberania nacional e
em prol de entrega de nossas riquezas; parceria da colocação do Brasil, no
campo da educação, na lógica do mercado, e não da formação com qualidade de
nossas crianças e jovens.
Madalena Guasco Peixoto é coordenadora da Secretaria-Geral da
Contee e diretora da Faculdade de Educação da PUC-SP
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