18 abril 2019

Uma crônica antiga (minha) para descontrair


Essa gente não sabe o que diz 
Luciano Siqueira


Minha relação com o computador se iniciou sob um clima de desconfiança. Da minha parte, claro. O amigo Eduardo Bomfim me falava das vantagens de escrever, corrigir, apagar, retomar ao texto original... tudo sem precisar refazer as coisas desde o início, como na máquina datilográfica ou no caderno de anotações. E da definitiva maravilha da Humanidade, a internet: “Numa fração de segundos, você envia uma carta para alguém no Japão, que lê e responde no ato!”, argumentava.

Meio conservador quando se trata de abrir mão de coisinhas simples que me dão prazer, resisti até quando pude. Deixar minhas fichas de leitura em cartão grosso pautado, nem pensar. E aquele barulhinho rítmico da máquina datilográfica, como viver sem ele?

Mas eis que minha filha Neguinha inicia o curso de arquitetura e um pc passou a ocupar espaço em nosso escritório de casa. Daí para que eu me convertesse às facilidades informáticas, foi questão de minutos. Amor à primeira vista – irresistível.

Já se foram alguns anos e posso assegurar que, com o computador, melhorou muito a minha capacidade de fazer inúmeras coisas ao mesmo tempo, além de ler, anotar, escrever, imprimir, divulgar. Em reuniões, laptop à mão, faço os registros necessários, preparo minhas próprias intervenções – e economizo papel, no que, segundo me asseguram os ambientalistas, ainda contribuo para a saúde do Planeta. Sem falar que me comunico com muita gente via e-mail, pelo Twitter e Facebook e, mesmo sem muito entusiasmo, pelo Orkut.

Tudo bem? Nem sempre. Aqui e acolá alguém tenta meter uma cunha entre mim e a informática. Por puro preconceito, acho. “Poxa, você não larga esse laptop!”, critica uma companheira de direção no PCdoB, ela bem situada na política e na vida, moderníssima. Ao que retruco com ironia: “E você não larga esse bloco de notas!”. No confronto direto, a razão está ao meu lado.

Se estou escrevendo algo e necessito de uma informação atualizada, basta acionar o Google que a tenho incontinenti. Um breve diálogo com o amigo a cinco mil quilômetros de distância, o msn me socorre na hora. Isso sem falar em minhas fichas de leitura, de há muito alçadas ao status de arquivo informatizado. E minha biblioteca particular, agora toda arrumadinha, com sistema de busca instalado. 

Por que então gente esclarecida e sensata implica com quem anda com um laptop a tira colo? Resistência à inovação, com certeza. Dificuldade de alterar comportamento enraizado. 

Ainda bem que as novas gerações nada têm contra. Meu neto Miguel, quando ainda curtia seus dois anos e meio, mais ou menos, ao receber um DVD de presente, dirigiu-se ao pc, ligou a geringonça, colocou o disco no drive e acomodou-se na cadeira para assistir o filminho que contava aventuras de pinguins, focas e ursos. Numa boa.

Bom, cá no aeroporto de Guarulhos, em longa espera de um voo para Recife, li umas tantas coisas, escrevi outras, inclusive essa despretensiosa crônica com o auxilio do meu laptop – a que rendo minhas homenagens, parafraseando o Cristo agonizante: “Perdão, essa gente não sabe o que diz...”.
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