Como a famosa batalha que não houve em Itararé, Superliga logo implodiu
É
fundamental ir devagar com o andor porque o
santo futebol também é de barro
Juca Kfouri,
Folha de S. Paulo
O
brilhante José Roberto Torero assim escreveu,
nesta Folha,
mais de 20 anos atrás: “Itararé dá nome também a uma grande batalha, a grande
batalha do movimento político de 1930, que colocaria frente a frente as tropas
simpáticas ao grupo revolucionário liderado por Getúlio Vargas e os esquadrões
fiéis ao presidente Washington Luís.
A notícia
desse confronto inevitável correu de boca em boca, foi citada na imprensa e
ajudou a formar um tenebroso clima de guerra civil. Soldados se dirigiam para o
front, mães rezavam por seus filhos, crianças ficaram à beira da orfandade e
mulheres anteviam os dias da viuvez.
Os dois
exércitos marchavam um ao encontro do outro e, pelos cálculos dos
estrategistas, a grande carnificina deveria acontecer em Itararé. Quando o rio
de sangue deveria começar a correr, no entanto, intensos boatos começaram a
chegar às trincheiras: eles davam conta de que o movimento revolucionário
ganhara a simpatia do povo, o presidente fora deposto e as tropas leais ao
governo estavam desertando. Diante dos novos fatos, o exército pró-Washington
Luís resolveu aderir ao espírito do tempo.
Assim, o
terrível, o tão anunciado confronto não aconteceu”.
A Superliga,
por inoportuna e atentar contra a gênese do futebol, morreu antes de nascer.
Deveria haver
uma Constituição Internacional do Futebol com duas cláusulas pétreas: 1. A
classificação para competições jamais será automática; 2. Sempre haverá acesso
e descenso.
Dito isso,
sublinhemos: nem a Fifa, nem a Uefa, a Conmebol, ou a CBF, merecem respeito ou
consideração, entidades corruptas que vampirizam os clubes e não distribuem,
nem mesmo em tempos de pandemia, os milhões que recebem em seus papéis de
intermediárias, de cartórios, embora uma ou outra até tenham áreas competentes
de marketing.
É verdade que
também a cartolagem dos clubes, com raras exceções, é farinha do mesmo saco,
apesar de, ao menos, representar quem faz o espetáculo, o que é muito mais de
detalhe.
Os 12
idealizadores da Superliga erraram a hora e o modo de fazer, para serem repudiados
mundialmente e, mesmo sendo constrangedor cerrar fileiras com a
Uefa, foi o que restou.
Milionários que em sua
maioria jamais calçaram chuteiras, ou sonharam em fazer gols em
Wembley, pensaram o futebol como se fosse basquete, hóquei, beisebol ou mesmo o
outro futebol, aquele americano.
Seja como for,
está dado o recado dos gigantes: o capitalismo globalizado quer mais e mais, sempre,
e danem-se os menores. É assim desde sempre e também no futebol.
Não fosse
e Oded Grajew não precisaria ter escrito a “Carta à
elite econômica”.
O mafioso,
fascistoide, assediador Silvio Berlusconi, aquele que veio depois da Operação
Mãos Limpas, já alertava em 1990 para a necessidade de reforçar os torneios
interclubes depois que a Copa do Mundo causou graves prejuízos ao futebol
italiano.
Então, era
fácil concordar com ele, mas mesmo hoje, por mais ainda constrangedor que seja,
é preciso reconhecer a necessidade de por fim às ditaduras das federações, do
monopólio estabelecido, desde que não seja
para criar oligopólio.
Quanto tempo
levará é difícil prever. Mas que é inexorável parece evidente.
Para tanto,
fundamental não errar na mão e ir devagar com o andor porque o santo futebol
também é de barro.
.
Para sua informação: Três pontos sobre a CPI da Covid https://bit.ly/2P5l2AZ
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