Fissura em relação com Exército é o pior enfraquecimento que Bolsonaro pode sofrer
A importância
dessa reversão é grande e pode ser decisiva na CPI do genocídio
Janio de Freitas,
Folha de S. Paulo
A perda de Bolsonaro com a encrencada substituição de comandos militares encontrou rápido meio de aferição. Em resposta à aprovação da CPI, no meio da semana voltou à insinuação ameaçadora: “O pessoal fala que eu tenho que tomar providências, eu estou aguardando o povo dar uma sinalização”. Para depois dizer que faz, ou fará, “o que o povo quer”. Nenhuma repercussão.
A interpretação geral daquele episódio, com o pedido de
demissão conjunta decidido pelos comandantes do Exército, da Marinha e da Força
Aérea, foi a de demonstrar o surgimento de uma distância, no mínimo
uma fissura, que rompe a conexão do Exército com Bolsonaro tal como induzida
ainda na campanha eleitoral. Esse é o pior enfraquecimento que Bolsonaro pode
sofrer nos seus recursos para ver-se sustentado a despeito do que faz e diz.
A importância da reversão é grande e pode ser decisiva na
CPI do genocídio. Antes, o Exército não precisaria explicitar
insatisfação com a CPI para inibir-lhe a criação ou a atividade. Sua
identificação com Bolsonaro o faria, por si só. A maneira distensionada como os
senadores procederam nas preliminares para a CPI já foi claro fruto do novo
ambiente sem cautelas e temores. O grau em que os senadores se sentiram
desamarrados mostra-se ainda maior por terem um general da ativa, Eduardo Pazuello, entre os itens mais visados pelo
inquérito.
Estudos
recentes, publicados nas revistas científicas Science e Lancet, juntam-se agora
a estudos científicos brasileiros e proporcionam levantamentos e análises
primorosos para poupar à CPI muitas pesquisas e apressá-la. Ainda que não seja
a ideal, sua composição é satisfatória; não será presidida por Tasso
Jereissati, como deveria, mas conta com sua autoridade; e Renan Calheiros, se
agir a sério, tem competência como poucos para um trabalho relatorial de
primeira.
Bolsonaro
tange o Brasil para os 400 mil mortos. Tem sido o seu matadouro. Estudo do
neurocientista Miguel Nicolelis conclui que ao menos três em cada cinco mortos
não precisariam ter morrido, no entanto foram vitimados pela incúria, a má-fé e
os interesses com que Bolsonaro e seus acólitos têm reprimido a ação da
ciência. Uma torrente de homicídios que não podem ficar esquecidos e impunes.
Do contrário, este país não seria mais do que uma população de Bolsonaros.
A ENGANAÇÃO
Joe Biden
insinua outra Guerra Fria. É curiosa a atração entre os democratas, não os
republicanos, e as guerras. Os Estados Unidos entraram na Primeira Guerra sob a
presidência do democrata Wilson. Na Segunda Guerra, a presidência era do
democrata Roosevelt. Bem antes dos chineses, em 1950 os Estados Unidos
entregaram-se à Guerra da Coreia levados pelo democrata Truman. O democrata
Kennedy criou a Guerra do Vietnã. E pôs o mundo a minutos de uma guerra
nuclear, de EUA e URSS, na crise dos mísseis em Cuba.
É contraditória a inadmissão de uma China em igualdade
com os Estados Unidos e a determinação de sustar o aquecimento global. A
primeira abre um risco de guerra em que questões como ambiente e clima não
subsistem.
Apesar disso, nos dias 22 e 23 os governantes de 40
países fazem uma reunião virtual sobre clima, por iniciativa de Biden. Os
americanos esperam comprar de Bolsonaro, por US$ 1 bilhão, o compromisso de
medidas verdadeiras contra o desmatamento na Amazônia, essenciais para deter o
aquecimento climático.
Esse
bilhão sairá caríssimo ao Brasil, porque o compromisso de Bolsonaro será tão
mentiroso quanto as afirmações que fará, como já fez em carta a Biden, sobre os êxitos do
governo na preservação da Amazônia.
Em março, o desmatamento foi recordista: 13%
maior que o de março de 2020. Desde o início do governo Bolsonaro, o
desmatamento por fogo, o roubo de madeira e o garimpo aumentam sem cessar. O
setor de fiscalização do Ibama foi destroçado. Bolsonaro protege o garimpo
ilegal, pondo-se contra a destruição de seu maquinário. O ministro do Meio
Ambiente, Ricardo Salles, protege os madeireiros criminosos.
Apresentado
há três dias, o Plano Amazônia 2021/2022 não é plano, nem outra coisa. Sua meta
de redução de desmatamento é maior do que o encontrado por Bolsonaro. Não
contém restauração dos recursos humanos, nem as verbas condizentes com esforços
reais. Mas “o governo dos Estados Unidos espera seriedade e compromisso de
Bolsonaro” na reunião. Espera o que não existe.
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Veja: Tem uma casca de
banana na “polarização” Lula x Bolsonaro. Veja
aqui https://bit.ly/3eLGZj1
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