Do economista pernambucano Luciano Coutinho, radicado em São Paulo, novo presidente do BNDES, leia esse artigo publicado na Folha de S. Paulo de domingo último.
O desafio da apreciação cambial
Não há dúvida de que o excesso de divisas ofertadas no mercado à vista em decorrência do superávit em conta corrente e dos crescentes ingressos de capitais pressionou a cotação do câmbio mas, de outro lado, o Banco Central e o Tesouro adquiriram (de 2004 até o presente) cerca de US$ 115 bilhões para enxugar esse excesso. Como resultado, aumentaram as reservas e reduziu-se a dívida externa e, ainda, evitou-se uma apreciação mais violenta da taxa de câmbio que, na ausência dessas operações de compra, já teria despencado para menos de R$ 1,80 por US$ 1.
A elevação da taxa Selic entre setembro de 2004 e boa parte de 2005 -motivada pelo esforço do BC de tentar cumprir a meta de inflação de 2005- efetuou-se em uma nova conjuntura extremamente favorável de robustecimento da posição cambial brasileira (graças ao grande superávit comercial) com queda concomitante do risco-país. Nesse contexto, desencadeou-se um volume crescente de operações de arbitragem para capturar o diferencial de juros e, ainda, apostar na valorização do real. O desenvolvimento do mercado de derivativos de juros e câmbio na BM&F (aberta a investidores externos desde o início de 2000) viabilizou esse intenso fluxo de operações de arbitragem através de contratos futuros ("swaps" e opções) e estimulou operações NDF ("non deliverable forward", em que não há transferência física do principal, mas apenas a liquidação do saldo de juros e variação cambial) no exterior.
A despeito da queda da taxa Selic nos últimos 18 meses, o diferencial de juros em reais continua sendo muito atraente e, dadas as características do nosso mercado de títulos públicos, de baixo risco. Artigos de autores como Márcio Garcia e Fábio Urban, da PUC-RJ, e de Daniela Prates, Maryse Farhi e Emerson Marçal, da Unicamp, mostram como esse lucrativo mercado de operações virtuais a futuro, em reais, com grande liquidez, interage e pressiona a apreciação da taxa de câmbio no mercado à vista (1). A lição óbvia é que se o BC quiser evitar um indesejável aprofundamento da apreciação da taxa de câmbio para abaixo de R$ 2 por US$ 1, deveria olhar para os dois mercados e atuar em ambos com firmeza. Além de sustentar as aquisições no mercado pronto como vem fazendo corretamente deveria, ainda, instrumentar-se para neutralizar as operações de arbitragem. "Ça va sans dire" que uma trajetória mais rápida de fechamento do diferencial de juros facilitaria muito a tarefa.
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(1) Garcia, Márcio G. P.; Urban, Fábio, "O Mercado Interbancário de Câmbio", Rio de Janeiro, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2004; Prates, Daniela M., Farhi, Maryse e Marçal, Emerson, "Os Determinantes da Evolução da Taxa de Câmbio do Real no Período 2003-2006", Cecon, IE/Unicamp, março de 2006.
(1) Garcia, Márcio G. P.; Urban, Fábio, "O Mercado Interbancário de Câmbio", Rio de Janeiro, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2004; Prates, Daniela M., Farhi, Maryse e Marçal, Emerson, "Os Determinantes da Evolução da Taxa de Câmbio do Real no Período 2003-2006", Cecon, IE/Unicamp, março de 2006.
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