Luciano Siqueira
Publikcado no Blog da Revista Algomais
A Constituição de 88 consagrou a autonomia entre os três entes federativos – a União, os Estados e os Municípios. Estados federativos com essa conformação, salvo engano, no mundo inteiro temos apenas o Brasil e a Federação Russa.
Esse princípio constitucional se afirmou num instante de verdadeiro culto ao municipalismo – ou, dito de outro modo, de veneração ao poder local. A ponto de autores e gestores de então, apressados e pouco lastreados teoricamente, formularem a hipótese de que no século XXI, que se aproximava, os Estados nacionais cederiam lugar ao protagonismo do poder local, de modo a que uma nova organização, nos moldes da ONU, viria para dar conta das relações diretas cidade-cidade mundo afora.
Mas, deixando de lado a baboseira, o fato é que nesses transcorridos vinte e quatro anos gradativamente se transferiu atribuições da União para a esfera municipal, sem entretanto o lastro financeiro correspondente. Daí a crise de financiamento que, envolvendo o Estado brasileiro desde o exagerado endividamento externo praticado no regime militar, o choque do petróleo do final dos anos 70 e a ruptura unilateral, por parte dos EUA, dos acordos do Breton Woods, recair sobretudo sobre o poder local.
Recentemente, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) divulgou estudo indicativo de que 4.372 prefeituras do país (83% das pesquisadas) dependem de repasses federais e estaduais para sobreviver. São, em geral, cidades pequenas, onde vivem 35% dos brasileiros.
Uma das vertentes do estudo é o pagamento de dívidas e gastos com pessoal, que cresceu R$ 37,6 bilhões de 2006 a 2010 e implica o comprometimento de metade das receitas das prefeituras.
Ora, nesse cenário é muito difícil firmar a autonomia municipal. E são evidentes as consequências disso, no sentido da dependência da gestão do poder local em relação ao Estado e à União Federal. Um elemento a ser considerado no debate que ora se trava entre partidos e pretendentes à liderança de chapas majoritárias tendo em vista o pleito de outubro. No mínimo, promessas exageradas devem ser evitadas, sob pena de compreendidas como demagógicas em detrimento da abordagem objetiva dos problemas que efetivamente se colocam na ordem do dia.
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