Os
craques não podem perder a liberdade de inovar e surpreender
Tostão,
na Folha de S. Paulo
Obviamente, nenhum craque, nem um Pelé,
deveria ter privilégios, dentro ou fora de campo, em clubes ou em seleções.
É essencial que o grande jogador também participe da parte
tática e que tenha funções definidas. Por outro lado, uma das atribuições de um
bom técnico é dar condições a todos os atletas, especialmente aos melhores, de
jogar no máximo de suas possibilidades individuais.
Não há contradições entre o individual e o coletivo. Um precisa
do outro. Os craques não podem perder a liberdade de inovar, transgredir,
surpreender.
O genial Romário, em uma mistura de sabedoria e malandragem, só
queria treinar o que faria no jogo.
Enquanto os outros corriam em volta do campo e participavam de
ações coletivas, ele, com a ajuda de um goleiro, treinava finalizações, de
todos os jeitos, e imaginava o que faria nas partidas.
Eu, que não era um Romário, sem nenhuma falsa modéstia, quando
jogava no juvenil do América recebi a seguinte orientação do técnico Biju:
"Treine bastante com todos, mas, se quiser ser um craque, trabalhe também
separadamente e pratique o que sabe fazer bem, para ser ainda melhor".
Por minha experiência de atleta e de comentarista, tenho a
impressão que muitos treinadores atuais, desde as categorias de base,
empolgados com os avanços da ciência esportiva e das estratégias, se esqueçam
de orientar os jogadores individualmente, para ajudá-los a atuar ainda melhor e
a se posicionar corretamente. Ensinar não é apenas treinar.
A obsessão pelo coletivo, em detrimento do individual —as duas coisas têm de andar juntas— fez com que, durante décadas, desaparecessem os
meio-campistas de grande talento, organizadores, pensadores, já que o
meio-campo foi dividido entre os volantes que marcam e os meias ofensivos que
atacam. A transição da bola, da defesa para o ataque, passou a
ser feita muito mais pelos chutões e pelos avanços dos laterais.
Isso tem mudado, lentamente. Vejo, neste momento, positivamente,
que muitos treinadores brasileiros têm procurado jogar um futebol de posse de
bola e de troca de passes da defesa para o ataque, embora o time mais eficiente
seja o Palmeiras,
que tem um jogo muito mais direto em direção ao gol. Há várias maneiras de
atuar bem e de vencer. Além disso, o Palmeiras,
de seu jeito, tem momentos também belíssimos.
Tite e a
comissão técnica da seleção têm sido muito criticados por darem privilégios a Neymar,
fora de campo, e por deixá-lo fazer o que quiser durante as partidas. Não vejo
assim. Isso pode ocorrer no PSG. O que Tite precisa melhorar é dar condições
para que Neymar, por meio de viradas rápidas de jogo e de seu posicionamento
correto, receba a bola mais perto do gol, sem uma dupla de marcação, para que
tenha condições de brilhar individualmente.
Tite e a comissão técnica precisam ser rigorosos
com Neymar,
quando ele dribla demais no momento errado, quando simula e quando dá socos em
torcedores.
A ALMA TAMBÉM GANHA - O Liverpool é campeão da
Europa. Quando Klopp assumiu
o comando, perguntaram quem ele seria, já que Mourinho era um "Special
One". Klopp respondeu: "Normal One". Foi mais que especial. O
técnico, por já ter sido duas vezes vice-campeão da Europa e pela competência e
simpatia, mereceu o título. Além de suas qualidades técnicas e táticas, ele
demonstrou que se ganha também com o coração, com a alma transbordando de
emoção.
[Ilustração: Juliane Mercante]
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