10 agosto 2020

Um guerreiro do bem


Dom Pedro Casaldáliga partiu

O bispo defensor dos povos indígenas e trabalhadores rurais morreu aos 92 anos

Portal Vermelho www.vermelho.org.br

Faleceu na manhã deste sábado, Dom Pedro Casaldáliga, Bispo Emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia (Mato Grosso), Missionário Claretiano e um dos mais importantes defensores da Teologia da Libertação. O anúncio foi feito em nota conjunta da Prelazia de São Félix do Araguaia (Mato Grosso, Brasil), da Congregação dos Missionários Filhos do Imaculado Coração de Maria (Claretianos) e da Ordem de Santo Agostinho (Agostinianos). Dom Pedro estava hospitalizado desde terça-feira (4), na Santa Casa de Misericórdia de Batatais, no interior de São Paulo em razão do agravamento de seu estado de saúde.
A nota de falecimento informa ainda que ocorrerão três velórios do corpo de Dom Pedro Casaldáliga. O primeiro será em Batatais, a partir das 15 horas na capela do Claretiano – Centro Universitário de Batatais. A missa de exéquias será celebrada no domingo (9), no mesmo endereço acima e será aberta ao público em geral, além de ser transmitida ao vivo pelo link https://youtu.be/spto8rbKye0. O link estará aberto para que outros veículos de comunicação possam retransmitir. 
O segundo velório ocorrerá em Ribeirão Cascalheira (MT) no Santuário dos Mártires, a partir do dia 10 de agosto, sem previsão de horário de chegada do corpo. E por fim, o terceiro velório será em São Félix do Araguaia (MT), no Centro Comunitário Tia Irene. O sepultamento será em São Félix do Araguaia. 
Teólogo da libertação 
Nascido Pere Casaldáliga i Pla na Catalunha, há 92 anos, Pedro Casaldáliga foi um dos maiores defensores e propulsores da Teologia da Libertação no Brasil, mas não se limitou a ser bispo. É poeta, tem veias jornalísticas e atuou ativamente contra a ditadura. Ajudou a defender uma população pobre, esquecida, ameaçada pelo latifúndio e reprimida pelo Estado militar em uma cidadezinha do interior brasileiro.
A sua vida foi relatada na biografia “Um bispo contra todas as cercas”, da autora Ana Helena Tavares, lançada em 2019. A obra resgata a vida do clérigo desde seus dias como Pere Casaldáliga (seu nome de batismo), até transformar-se em Pedro, bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia – um lugar escondido no estado do Mato Grosso que teria destaque nacional pela chegada do espanhol.
Ao tornar-se bispo, Dom Pedro não perdeu tempo para relatar o que via na região – uma predominância do latifúndio sobre a vida e a exclusão dos cidadãos das tomadas de decisão das próprias terras e vidas.
Foi dele a primeira denúncia por trabalho escravo contemporâneo que repercutiu internacionalmente no início da década de 1970, como lembrou o jornalista Leonardo Sakamoto, autor do livro “Escravidão Contemporânea (2020).
Escreveu uma carta pastoral aberta intitulada “Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social”, que alçou voos, alcançou Leonardo Boff, José Oscar Beozzo e outros teólogos, e firmou naquele ponto do mapa uma movimentação importante de ideais para a Igreja Católica brasileira.
Se os nomes de Julio Lancellotti, Frei Betto e Dom Paulo Evaristo Arns são projetados até hoje como referências para a discussão de direitos humanos na Igreja Católica, Pedro Casaldáliga não fica atrás. Por muitas vezes, esteve na vanguarda da linha de fogo. “Na década de 70, a percepção da dimensão da figura do Pedro era outra. Ele teve uma projeção nacional e internacional muito grande”, diz Ana Helena Tavares, que se encontrou com o bispo em São Félix do Araguaia algumas vezes no processo de escrita da biografia. “Ele é uma pessoa que se preocupou em dar divulgação ao que fazia”.
A relevância dada à informação em tempos de censura fez com que Casaldáliga estivesse na lista de mais censurados do jornal O Estado de S. Paulo entre 1972 e 1975, mas não o impediu de denunciar as vezes em que foi amordaçado em cartas para os bispos. “Como é bom ser perseguido pela causa do Evangelho, da Justiça e da total Libertação!”, escreveu, na ocasião em que foi submetido a um cárcere privado em uma das quatro vezes que a prelazia teve intervenção de militares.
Para a autora, a escrita do livro vai contra “um Brasil que não cultua a memória”. Tavares acredita que resgatar a imagem de Pedro, mesmo depois de quase 15 anos de sua aposentadoria, é relevante para reverter o processo vigente de ódio no país. Os diversos depoimentos de pessoas que conviveram, admiraram e seguiram dom Pedro também evidenciam essa necessidade.
Casaldáliga, que também sofria de mal de Parkinson, vivia acamado em São Félix do Araguaia. ““Ser o que se é / Falar o que se crê / Crer no que se prega / Viver o que se proclama / Até as últimas consequências”.
(Com informações da Prelazia de São Félix do Araguaia e da CartaCapital)
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