Carro, pra que te quero?
Luciano Siqueira
instagram.com/lucianosiqueira65
Todos nós conhecemos aquele tipo que concentra todos os seus desejos no carro do ano, mesmo sem o poder aquisitivo para tanto, que trata a sua fubica com mais carinho do que à mulher amada. A comparação não é feliz, mas é a crua realidade. Tanto que jingles nas rádios e comerciais na TV reforçam essa atitude, digamos, rebaixada do ser humano envolto na areia movediça da sociedade de consumo.
Isso acontece aqui e em toda parte.
Nos EUA, por exemplo, foi divulgada uma pesquisa patrocinada pela da Rede de Saúde
do Homem e pela Abott, que revela que a maioria dos homens considera mais
fácil cuidar do carro do que da própria saúde. Nada menos do que 70% dos
501 homens entre 45-65 anos entrevistados pensam assim.
Aí a gente fica sem saber se o
problema é de descaso com a própria saúde ou de amor excessivo ao objeto de
consumo. Na dúvida, crave nas duas alternativas.
A segunda é até compreensível no caso
dos homens norte-americanos, onde tudo se consome sem o crivo da necessidade
básica, às custas do resto do mundo. Pelo menos a população incluída no
mercado, tirante os mais de 30 milhões de excluídos (segundo se divulga).
Mas não cuidar da saúde é coisa de
gente pouco esclarecida, não é mesmo? Aliás, não é a primeira vez que me dou
conta de que a tal “população culta e educada” que frequenta o imaginário de
nós outros periféricos nem sempre corresponde à realidade.
Quando vice-prefeito do Recife, ainda
na gestão do prefeito João Paulo e do nosso secretário de Saneamento, Antonio
Miranda, participei de uma conversa com técnicos alemães que nos apresentaram
tecnologias avançadas na revitalização de recursos hídricos. A certa altura, um
deles, após explicar como haviam revitalizado o rio Reno, arrematou: “Mas foi
necessário um imenso esforço de educação ambiental junto à população!”
Epa! Então a população alemã não
havia até então assimilado a necessidade de preservar o ambiente?
De outra feita, em Paris, fotografei
(e guardo em meu arquivo pessoal) a Praça Pigalle, nas proximidades do Moulin
Rouge, absolutamente infestada de lixo – isso a umas 4 da tarde! Sinal de que
para os franceses nem sempre cabe o rótulo de população “esclarecida”.
Por isso esse caso dos americanos que
cuidam mais dos seus carros do que de si mesmo já não me surpreende tanto. Nem
aos próprios – ou seja, às autoridades da área da saúde. Daí deflagrarem uma
campanha com o objetivo de aumentar o conhecimento sobre as questões
relacionadas à saúde do homem, incentivando exames periódicos para checar
regulamente testículos, próstata, colesterol, testosterona e pressão arterial.
Bem que o slogan da campanha podia
ser “O caminho da oficina passa pelo consultório médico”.
[Se comentar, identifique-se]
Crônica publicada no Blog da revista Algomais
em abril de 2013
Leia também o poema "Não-coisa", de Ferreira Gullar https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/10/palavra-de-poeta_76.html

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