Duas pedras de toque da reforma política
Luciano Siqueira
Partidos fortes e lisura nos processos eleitorais, duas condições para o fortalecimento da democracia. Alguém tem dúvidas?
Se você respondeu que ninguém duvida disso, errou. Porque esses dois fundamentos de uma reforma séria e de sentido democratizante são proclamados quase que unanimemente apenas da boca pra fora, como se diz comumente. Na hora do vamos ver, de se adotarem mecanismos eficazes que os possibilitem, surge uma imensa onda de conservadorismo. Pela voz de próceres dos grandes partidos, reverberada intensamente pela grande mídia.
Vejamos. Hoje, como se sabe, o eleitor vota em candidatos, e não em partidos. Mira supostos atributos individuais, e não programas. Uma porta sempre aberta para que o eleito mude de partido ou vote contra a orientação partidária no parlamento sem que tenha de dar satisfação a ninguém. E o ato de infidelidade muitas vezes é saudado como imperativo da consciência individual! Daí a necessidade de se adotar o sistema de listas, no qual o partido apresentaria nominata própria em ordem decrescente de candidatos que assumiriam uma cadeira no parlamento conforme o número de vagas conquistadas pela legenda. Todos obviamente com o compromisso de defender o programa partidário e se comportar em coerência com ele. E o eleitor de posse das defendidas pelo partido, que serviria de critério para avaliar o desempenho dos parlamentares eleitos.
Esse sistema poderia acrescentar uma variante: o eleitor votaria na legenda e também num dos candidatos constantes da lista, podendo assim, pela votação nominal, alterar a ordem dos candidatos. Em alguns países acontece assim.
A outra medida, o financiamento público de campanhas, por seu turno, contribuiria enormemente para estabelecer condições de disputa menos desiguais entre os partidos e arrostaria as relações promíscuas entre grupos econômicos e detentores de mandato no Legislativo e no Executivo. Ao final das contas, uma poderosa vacina contra a corrupção decorrente do entrelaçamento doloso entre interesses públicos e privados.
Está claro? Mesmo assim, de maneira sucinta, e sabendo-se que na quase totalidade dos países que praticam eleições regulares as coisas funcionam desse jeito, no mínimo se deveria experimentar no Brasil. Para elevar a consciência política dos eleitores e para fortalecer os partidos. Mas é praticamente impossível agora devido à maioria conservadora na Câmara e no Senado.
Quem sabe o tema ganhe relevo na campanha de 2010 e se crie uma consciência social mais ampla da necessidade desses mecanismos moralizadores e democratizantes. Assim, uma nova correlação de forças poderia se formar no Congresso e, com apoio na opinião pública, a reforma política enfim venha a se concretizar. Por enquanto, o melhor que pode acontecer é nada mudar – para que se evite o pior, ou seja, a adoção de normas restritivas da democracia. www.lucianosiqueira.com.br
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