30 junho 2020

Ricas raízes


Nomes diferentes, resistência em comum
Zanzul Alexandre*


Neste último final de semana encontrei, numa dessas salas virtuais que utilizamos para fazer reunião nesse momento de isolamento, uma mulher que me trouxe muitas boas lembranças. Há quem ainda hoje não acredite que meu primeiro nome é Zanzul, e ela foi uma das mulheres que me ajudaram a compreender os motivos e a revolução que é colocar um nome incomum, porém com uma origem que a maioria do nosso povo carrega, a origem negra, africana. 

Esse nome surgiu de um conceito dos meus pais: ter filhos que mostrem para a sociedade nomes diferentes dos ingleses, americanos e portugueses... Existem nomes de origem iorubá, como é o do meu caso, que tem significados tão lindos como qualquer outro nome, porém são desvalorizados por termos, ainda, uma cultura de menosprezar tudo que vem da periferia, do povo, do negro.

Zanzul em português significa personalidade forte, entretanto meus pais encontraram esse nome num acaso muito oportuno: contando histórias enquanto ainda estava na barriga de Mainha. O livro infantil se chama, “História de dois amores”, do grandioso escritor e poeta Carlos Drummond de Andrade. Pronto, era o que faltava para combinar um casal com uma filha e a ideia de colocar um nome diferente. 

Confesso que esse nome me deu muito trabalho na infância, porém hoje em dia acho maravilhoso, um nome diferente, contar a história dele e o que ele significa é sempre muito gratificante. 

Há um tempo atrás achei uma família oriunda da Síria, refugiados de guerra, que se mudaram para a Argentina que lá se chamavam Yanzul, porém quando chegaram na imigração, em vez do "y" colocaram o "z" e ficou exatamente como meu nome: Zanzul. A gente se encontrou no facebook, até hoje conversamos, para eles eu seria uma esperança da família deles aqui, porém mesmo não sendo, surgiu a amizade virtual e eles confirmaram: todos da família tem personalidade forte. 

Ter um nome diferente carregado de história e significados é um ato de resistência. Lembro-me incontáveis vezes, as pessoas que mal me conheciam falando "que nome esquisito" "muda esse nome, você tem direito sabia?!" e eu simplesmente não me cabia, afinal como pode um nome ser tão bonito e ser tão entranho para alguns?! 

A verdade é que hoje, entendo, assimilo e sei do que um ato de resistência é capaz de fazer. Ele muda a percepção das pessoas no seu entorno, fazem perceber que há coisas mais importantes para serem debatidas e defendidas. A história do povo brasileiro vai muito mais além de um encontro feito por Portugal. Somos um país com índios, imigrantes, um povo negro com história de resistência e muita luta até hoje. 

Por isso, que venham mais "nomes esquisitos" pra gente resistir e contar a nossa história.
*Zanzul Alexandre é formada em Gestão de Turismo e pós-graduanda em Sustentabilidade Urbana pelo Instituto Federal de Pernambuco.
Com um livro à mão para resistir https://bit.ly/3cAI1te

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