Precarização do trabalho precário
Marcelo Uchôa,
Jornal GGN
Vídeo
veiculado na internet pelo movimento Treta no Trampo vem
demonstrando a humilhação que é trabalhar como entregador de aplicativos.
Rappi, Uber Eats, ifood, James, Loggi, não interessa, todas estas empresas,
algumas das quais multinacionais, vêm lucrando aos montes não apenas com o
aumento das solicitações de entrega em casa, em função da pandemia, mas,
também, com a exploração sobre seres humanos que, em sua luta diária pela
sobrevivência, não possuem outra alternativa de vida senão arriscar-se às ruas
para, por um lado, satisfazer o desejo de quem pode se poupar em casa e, por
outro, robustecer os cofres das organizações que representam. Organizações que,
diga-se de passagem, nada produzem, apenas intermediam o recrutamento de
mão-de-obra barata para realizar a entrega de um produto produzido noutra
empresa a um terceiro destinatário. Empresas que se dedicam, única e
exclusivamente, a atender um pedido via internet (on-line) e viabilizar,
indiretamente através do labor alheio, a entrega pessoal do produto solicitado.
Para a literatura neoliberal, afeita a recorrer a anglicanismos, são startups online-to-offline (O2O).
Entregadores
de aplicativos não gozam de reconhecimento de vínculos de emprego, recebem por
corridas e são selecionados para estas através de pontuações obtidas por
decisões unilaterais das O2O, as quais obedecem a critérios amplamente
subjetivos, que podem ser tanto os feedbacks positivos
dos solicitantes das encomendas, como outros menos civilizados, por exemplo: o
não trabalho às sextas à noite, aos sábados e aos domingos não gera pontos; a
indisposição de cumprimento de largos percursos ou idas a sítios em locais
perigosos, por contraprestações pecuniárias miseráveis, também não gera;
paralisação por panes em motocicletas ou bicicletas, idem; o mesmo para
acidentes sofridos no trânsito.
Para as empresas que produzem as encomendas são
trabalhadores autônomos. Para as organizações a que servem são empreendedores
semeando oportunidades na crise. Para os que solicitam a entrega, pouco
importa, se um não pode cumprir a tarefa, outro pode. Em resumo, são
descartáveis. Seres humanos disponíveis ao abate pelos riscos da pandemia, do
trânsito, da criminalidade, na dureza do sol a pino, assumindo por conta
própria todos os ônus e incertezas da atividade econômica, pela inexistência de
proteção trabalhista, cobertura previdenciária, apoio social. Sequer sindicatos
possuem, já que formalmente não compõem categoria. Uma situação inequivocamente
vexatória. Em termos laborais, a precarização de um trabalho, por natureza, já
precário. A própria precarização do trabalho precário!
O
movimento Treta no Trampo está convocando
entregadores de aplicativo para uma paralisação no próximo dia primeiro de
julho. Pedem que legisladores definam os parâmetros dessa relação atualmente
imoral, que Judiciário ponha termo à penúria em curso. Vale ressaltar que, de
modo esporádico, o Judiciário já vem enfrentando questionamentos sobre o tema
e, mormente possuir posições indefinidas, não pode se esquivar de decidir pela
proteção da dignidade humana do trabalhador. Aqueles que possuem consciência de
que a exploração do homem pelo homem, se não deve ser evitada de vez, deve ser,
pelo menos, mitigada, têm o dever ético de apoiar as reivindicações dos
entregadores de aplicativo.
No
dia primeiro de julho, nenhum pedido por aplicativo de entrega deve ser
realizado, nenhum centavo deve ser concedido a empresas que não se condoem de
tratar pessoas como objetos. Todo apoio aos entregadores.
Crise sem fim envolve o governo https://bit.ly/2ArYe6Y
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