22 setembro 2022

Novo governo Lula

Sinais de virada precoce para um governo Lula 3

Antes mesmo da posse, um novo governo terá de fazer alianças e remendar o Orçamento
Vinicius Torres Freire, Folha de S. Paulo

 

O voto útil, o risco de alguma violência, de gracinha dos generais fiscais de urna e um par de disputas estaduais são os assuntos deste fim de campanha. Uma debandada precoce para Lula da Silva (PT) começa a surgir na conversa, embora uma decisão já no 2 de outubro ainda esteja no universo do aleatório.

O assunto não é motivado exatamente por adesões tais como a de Henrique Meirelles ao lulismo e de outras figuras simbólicas. Meirelles foi eleito deputado federal pelo PSDB em 2002, presidente do Banco Central de Lula de 2003 a 2008, ministro da Fazenda da "Ponte para o Futuro" de Michel Temer, do MDB "com Supremo, com tudo", de 2016 a 2018, e secretário da Fazenda do tucanato em estado terminal de João Doria, 2019 a 2022.

Meirelles ora está no União Brasil, união instável entre o DEM, o velho PFL, e parte do partido que Jair Bolsonaro alugou em 2018, o PSL. O outro bando de bolsonaristas originais, por assim dizer, foi parar no PL. A enumeração quase caótica dessas siglas não é por acaso.

O assunto da debandada aparece porque, na surdina ou abertamente, há novas adesões a Lula. Há gente do próprio PL, há gente do PSDB que não vê futuro nas ruínas do partido e outros adesistas no União Brasil. Parte do MDB que não aderiu a Lula na primeira leva já "manda sinais". O racha vai ser meio feio, mas parte do PSD de Gilberto Kassab vai aderir a um Lula 3.

E daí? Mesmo neste país mais partido do que nunca, as debandadas adesistas não são de estranhar. Depois de 2002, na eleição de Lula 1, uma fatia gorda do então grande PFL pulou para o barquinho de partidos menores a fim de atracar em algum carguinho no governo petista.

Embora tudo isso seja ainda especulativo e incerto (como o é uma vitória lulista no dia 2), o assunto é relevante porque a primeira tarefa de um novo governo, lulista ou bolsonarista, é remendar o Orçamento de 2023. Sempre uma ficção, a tabela de gastos é agora uma fantasia elevada ao quadrado por causa de promessas "firmes" de gasto extra apresentadas nesta campanha.

 

Lula e Bolsonaro prometeram um Auxílio Brasil de R$ 600, para o que não há dinheiro previsto. Lula sugeriu que pode corrigir o salário mínimo e o dos servidores já em 2023 (também não há dinheiro previsto).

Falta, por exemplo, previsão de dinheiro para o Farmácia Popular. Sabe-se lá o que será feito do subsídio para combustíveis, talvez de precatórios e compensações para estados e municípios (que reclamam da perda de receita com a redução das alíquotas do ICMS), casos que estão ou ficarão enrolados na Justiça.

Esse nem é o debate duro, difícil e fundamental acerca da reforma das regras fiscais (que tipo de "teto" ou limite vai haver, se algum). É apenas o remendo das contas finais e avacalhadas do governo Bolsonaro. No entanto, um ligeiro estelionato eleitoral, a quebra dessas promessas de campanha, seria um mau começo de governo —não tanto quanto o desastre que praticamente selou o destino de Dilma Rousseff em 2015. Mas não vai ser bom.

Além disso, uma eventual debandada para um hipotético Lula 3 e a composição partidária para remendar o Orçamento serão um primeiro teste de viabilidade política da coalizão que governará a partir de 2023.

Há dúvidas várias. O núcleo do centrão, ora regido pelo PP em colaboração com o PL, queimou navios e pontes com Lula, embora sempre possam boiar até a outra margem, como ocorre com tantos dejetos. Há uma extrema-direita feroz, antilulista e há até esse novo PDT de Ciro Gomes. Etc.

Se a eleição acabar logo, o novo governo terá de começar ainda mais cedo.

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