Ângelo Oswaldo de Araujo Santos, na Folha de S. Paulo
Um impasse foi criado no imenso
território da cultura. A reintegração do Ministério da Cultura ao MEC, como
proposto pelo governo Michel Temer, não daria vida a uma letra morta há 31 anos.
O Ministério da Educação manteve a
sigla, após a emancipação da Cultura, em 1985, porque o "C" não
tivera maior significação. Havia ali representado apenas uma secretaria
comprimida pelo peso das tarefas educacionais e a força das universidades.
O ex-presidente Fernando Collor errou
ao transformar o Ministério da Cultura (MinC), em 1990, em uma secretaria
entregue a Ipojuca Pontes e à mestria dos caricaturistas, em meio a protestos
de todas as procedências. A maioria dos setores culturais posicionou-se
radicalmente contra o governo. Restaurado pelo presidente Itamar Franco, o MinC
rendeu-lhe a simpatia da classe artística e o apoio do cinema nacional.
Instalar novamente uma Secretaria da
Cultura diretamente vincula à Presidência da República levaria ao palácio uma
ação que não é benesse do chefe do Executivo, mas política de Estado.
Emenda à Constituição consagrou o
Sistema Nacional de Cultura, que prevê um órgão gestor, o Fundo Nacional e o
Conselho Nacional de Política Cultural, entre outros pontos inerentes à ação
sistêmica. Todos os Estados da Federação dispõem de um Plano Estadual de
Cultura -Minas Gerais se prepara, na Assembleia Legislativa, para votar o
último deles.
Numerosos municípios igualmente
aderiram ao sistema da Cultura. A extinção do ministério está em conflito com a
normativa prevista na Carta Magna.
A verba do Ministério da Cultura em
2015 correspondeu a 0,12% do Orçamento da União. Com recursos relativamente
módicos, o governo poderia reavivar os programas contingenciados e aquecer a agenda
da cultura, obtendo a atenção de artistas, autores, produtores, grupos e
movimentos.
Os chamados Pontos de Cultura e Pontos
de Memória, numerosos país afora, são núcleos combativos que podem, caso
atendidos após os cortes, estabelecer um processo político de opinião positiva
em relação ao novo momento, após uma primeira primeira impressão bastante
desfavorável.
O Fórum Nacional dos Secretários e
Dirigentes Estaduais de Cultura já se posicionou reativamente à proposta do
governo. Da mesma forma, o Fórum Nacional dos Secretários de Cultura das
Capitais.
Há ainda vários outros fóruns da área
de patrimônio histórico e criação artística. Muitos municípios possuem
secretarias de cultura. Há cerca de 700 Conselhos Municipais de Patrimônio
Cultural só em Minas.
O governo Temer quer fazer da Cultura
apenas um acessório dentro da gigantesca estrutura da Educação, como ocorreu
até 1985, ou apêndice palaciano no Planalto, sem meios eficientes de
interlocução, pondo fim a um diálogo que concorreu para com o fortalecimento do
campo, cuja notável projeção na economia nacional mais uma vez é
desconsiderada.
Entre tantos cortes, não se há de
abolir a sensibilidade intelectual e artística numa hora tão grave como a que
atravessa o Brasil.
ANGELO OSWALDO DE ARAÚJO SANTOS é secretário de Estado de Cultura de Minas Gerais. Foi presidente
do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e chefe de Gabinete de Celso Furtado
no Ministério da Cultura (1986-1988)
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